domingo, 15 de maio de 2016

Aposta certeira

Quanto custa queimar a carreira de um jovem piloto para trazer outra promessa para a sua equipe? Este foi o questionamento feito à Red Bull, mais especificamente à Helmut Marko, que promoveu a polêmica troca entre Daniil Kvyat e Max Verstappen entre as corridas da Rússia e da Espanha. Mesmo Verstappen tendo muito mais potencial, muito se criticou a crueldade com Kvyat. Tudo isso seria apagado com uma boa atuação de Verstappen em algum momento na temporada. Contudo, a precocidade marca a curta carreira de Max Verstappen e o holandês só precisou de uma corrida para mostrar que o chato e ranzinza Helmut Marko estava certo em trocar o rápido e atrapalhado Kvyat pela promessa de fenômeno Max Verstappen. Numa corrida histórica em vários aspectos, Verstappen se aproveitou da pane mental de Hamilton para superar as Ferraris e seu companheiro de equipe Ricciardo para se tornar o mais jovem vencedor da história da F1 com 18 anos e sete meses.

A corrida hoje de Barcelona saiu do script de provas chatas na cidade espanhola e hoje vimos uma corrida emocionante e apertada do começo ao fim, que irá ecoar ainda por muito tempo. Primeiro, a Mercedes. Um toque, um zero ponto da Mercedes não seria nenhuma surpresa em algum momento da temporadas e até mesmo das duas anteriores. Nico Rosberg e Lewis Hamilton não são mais amigos há dois anos. Após a classificação, Hamilton aproveitou para dar algumas cutucadas em Rosberg, dizendo que conquistou todas as poles quando não teve problema no sábado. Mesmo inferior tecnicamente, Rosberg está num ótimo momento e mesmo não largando muito melhor do que Hamilton, conseguiu uma bela ultrapassagem por fora da curva um. Aquilo pode ter mexido na cabecinha de Hamilton, que tinha se comportado tão bem nos últimos tempos. Perdendo a vantagem da pole, 43 pontos atrás do rival no campeonato e querendo demarcar terreno, Hamilton não esperou mais do que algumas centenas de metros para atacar de forma agressiva Rosberg, que fechou de forma forte, mas sem ser desleal. A agressividade de Hamilton se tornou loucura quando Rosberg ficou totalmente por dentro e Lewis tentou achar espaço na grama. Alguém lembra da musiquinha do Programa do Ratinho nos testes de DNA? Pois essa 'canção' ecoou nos boxes da Mercedes na medida em que os dois carros prateados, na presença do presidente da Daimler nos boxes da equipe, saíram voando na curva quatro, destruindo a corrida dos dois e da Mercedes, para espanto de quem estava nas arquibancadas e dos milhões que acompanhavam a corrida pela TV. A chance de virada de Hamilton foi pro vinagre no momento, mas sua moral com a equipe desmoronou completamente. A relação entre Nico e Lewis, já abalada não de hoje, mas desde que a Mercedes se tornou a equipe dominante da F1, tende a piorar, mas Rosberg tem clara vantagem nesse entrevero. Hoje, somente a Mercedes pode conquistar o campeonato e com os dois pilotos zerados, Nico tem os mesmo 43 pontos de vantagem sobre Lewis, com uma corrida a menos para se disputar. Estou curioso para ver o que Hamilton dirá dessa disputa, o mesmo acontecendo com Rosberg, Wolff e Lauda. O clima na Mercedes ferverá!

Com a Mercedes fora da corrida com poucos metros de ação, a corrida caía no colo da Red Bull e da Ferrari, que tinham uma rara chance de vencer. A Red Bull tinha se mostrado superior à Ferrari em ritmo de classificação, mas os italianos sempre se mostraram melhor em ritmo de corrida. Ricciardo e Verstappen, estreante na equipe, ou seja, sem muita experiência com o carro, lideravam e ainda tinham a ajuda de Carlos Sainz, que largou muito bem e estava em terceiro, na frente das Ferraris de Vettel e Raikkonen. Deixando o espanhol para trás, Vettel tentou o ataque em cima de Verstappen e, posteriormente, em cima de Ricciardo. Inicialmente, essa parecia ser a briga pela vitória: Ricciardo x Vettel. Com pneus macios Ricciardo andou bem melhor do que Verstappen, mas os pneus tiveram vida curta e com pneus médios, Verstappen parecia melhor, o mesmo acontecendo com Vettel. Estabeleceu-se os três correndo separados por 1s, mas sem muitas disputadas. Então Vettel e Ricciardo, que pareciam brigar pela vitória, anteciparam suas paradas. Era uma briga de gato e rato da Ferrari e da Red Bull, que apostavam claramente nos seus dois primeiros pilotos. Porém, Verstappen e, mais atrás, Raikkonen faziam uma corrida dentro do script e quando novamente Vettel e Ricciardo pararam, com vantagem para Vettel, que saiu 7s na frente de Ricciardo, em terceiro, estabeleceu-se a dúvida: parar uma terceira vez com Verstappen e Raikkonen? Conhecendo o histórico de Raikkonen em preservar os pneus e o veterano já calçado com os médios, podia-se esperar que o finlandês desse o pulo do gato e não parasse mais. E Verstappen? O jovem holandês estava estreando num carro que mal andara e era mais conhecido pela agressividade. O tempo foi passando e Raikkonen talvez estivesse esperando uma terceira parada de Verstappen que nunca veio e quando tentou algo, seus pneus estavam desgastados demais, pelo tempo em que ficou atrás da Red Bull. Numa história de contos de fadas, Max Verstappen, que corria de kart até 2013 e duas semanas atrás amargava um abandono na Rússia com seu Toro Rosso, estreou na Red Bull e numa pilotagem impressionante, se tornou o piloto mais jovem da história da F1 a vencer uma corrida. Surgirão muitos questionamentos de que a F1 estaria tão fácil, que até um moleque de 18 anos pode vencer uma corrida. Isso são os inconformados. Olhando pelo lado do copo meio cheio, podemos estar presenciando um momento histórico, de um piloto diferenciado aparecendo na frente de nossos olhos. Um verdadeiro fenômeno!

A Ferrari subiu ao pódio com seus dois pilotos, mas ficou um gosto amargo na boca por ter perdido uma chance tão clara de vitória. Faltou agressividade em Raikkonen, que parecia certo de que Verstappen pararia em algum momento e por isso apenas escoltou o holandês e quando percebeu que o holandês não pararia mais, se viu sem pneus e teve que se conformar com o segundo lugar. A forma como Vettel se aproximou dos carros da Red Bull indicava que ele venceria a prova, mas a Ferrari cometeu o mesmo erro da decisão do título de 2010, quando se concentrou unicamente em Webber e se esqueceram de Vettel. Hoje, a Ferrari focou apenas em Ricciardo e se esqueceram de Verstappen, fazendo que a estratégia funcionasse para que Vettel ficasse à frente de Ricciardo, mas não na frente de Max. Vettel subiu ao pódio e ficará novamente com fama de chorão ao xingar quando foi atacado por Ricciardo nas voltas finais. Mesmo sendo mais rápido do que Raikkonen em boa parte das classificações, hoje Sebastian está atrás de Kimi no campeonato. Se Raikkonen pouco tentou ultrapassar Verstappen lá na frente, o mesmo não se pode dizer de Ricciardo, que tentou a ultrapassagem várias vezes em Vettel, colocando de lado três vezes na curva um, forçando ainda mais os seus desgastados pneus médios. A conta viria na penúltima volta, quando o pneu traseiro esquerdo furou e Ricciardo teve que se conformar com a quarta posição. Pior do que perder o pódio, é ver seu reinado dentro da Red Bull bastante ameaçado. Claramente mais rápido do que Kvyat e com a confiança total dos dirigentes, Daniel agora vê um Max Verstappen planamente fortalecido dentro do seio da cúpula da Red Bull e com a fama de campeão em potencial. Quem subiu para receber o troféu de vencedor pela Red Bull? Helmut Marko. E é o austríaco quem dita as ordens na Red Bull. Será outro ponto a ser observado no futuro: como se comportará Ricciardo dentro da Red Bull daqui para frente?

Com a corrida tão cheia de histórias e emoções na frente, os pilotos de quinto para trás foram ainda mais coadjuvantes do que normalmente o são. Bottas não largou bem, mas assim como fez as Ferraris, deixou Sainz para trás na primeira rodada de paradas e o finlandês ficou quietamente em quinto a corrida inteira. Felipe Massa fez uma boa corrida de recuperação após o erro da Williams na Classificação e ganhou dez posições no grid, chegando em oitavo e amealhando mais pontos no campeonato. Sainz largou bem, mas sem ritmo, segurou por muito pouco tempo as Ferraris, se achando em sexto e terminando a corrida na importante posição. Comparado à Verstappen em seu primeiro ano de F1, vendo o que holandês pode e deve fazer, Sainz sai fortalecido no futuro, pois o espanhol andou sempre próximo de Max na Toro Rosso. Se Verstappen obteve um sucesso extraordinário em sua estreia na Red Bull, Kvyat não foi tão bem em sua reestreia na Toro Rosso, ficando com o último ponto da corrida, após sempre andar atrás de Carlos Sainz. Kvyat terá que remar muito, se quiser refazer sua carreira na F1. Sergio Pérez fez uma prova discreta rumo aos pontos, num momento em que o mexicano se mostra bem mais forte do que o badalado Nico Hulkenberg, um dos poucos abandonos do dia, mas sempre fora da zona de pontos. Alonso decepcionou a torcida quando abandonou já no final da corrida, mas se o espanhol andou bem mais rápido do que Button na classificação, o inglês virou o jogo na corrida, largando melhor do que Alonso e terminando em nono. Alonso estava na zona de pontos quando abandonou, a McLaren vem evoluindo, mas ainda está longe do que a equipe e a Honda podem fazer. A Hass quase marcou pontos com Gutierrez, o que seria os primeiros do mexicano, mas Esteban foi superado por Button e Kvyat nas voltas finais e ficou em 11º, com Grosjean abandonando no final, quando andava atrás do mexicano. Realmente para Grosjean andar atrás de Gutierrez, algo de errado havia com o carro. Enquanto a Red Bull venceu a corrida com seus motores, a equipe Renault mal apareceu na TV, ficando discretamente fora dos pontos, mas já percebe-se que Kevin Magnussen está um ou mais degraus acima de Jolyon Palmer, que tanto chiou quando Nasr subiu da GP2 e ele, como campeão, não. Falando em Nasr, o brasiliense foi superado por Ericsson e com uma Sauber cambaleante, pega extremamente mal para Felipe se manter na F1 em 2017, mesmo com todo o aporte financeira que tem. A Manor pouco apareceu, se não levando voltas.

O Grande Prêmio da Espanha de 2016 foi cheio de histórias que marcarão a F1 pelas próximas semanas e, por que não, pelos próximos anos. O clima dentro da Mercedes ficará ainda mais pesado com mais um erro de Hamilton, que garantiu o primeiro zero da equipe tedesca desde 2012. Num momento em que Arrivabene está 'prestigiado' dentro da Ferrari, não vencer uma corrida onde a Mercedes não completou sequer uma volta não deixa de ser um mal resultado para os italianos. Porém, o que ficará na história é: até onde irá parar Max Verstappen?