domingo, 25 de novembro de 2012

Palco perfeito

Bernie Ecclestone é um homem de negócios as vezes não muito claros e lógicos à primeira vista, mas o inglês deveria, não importando com os possíveis prejuízos e o desconforto, deixar Interlagos para sempre como a corrida final da temporada da F1, pois dificilmente uma pista e um local proporcionará finais de campeonato tão arrepiantes quanto o velho Autódromo José Carlos Pace. Nelson Piquet, em 35 anos de F1, disse que hoje foi a corrida mais 'excitante' que ele já viu e não duvido muito da escolha do tricampeão. Hoje teve de tudo. Se em 2008 o final de campeonato teve emoção no início e no final da prova (com as pancadas de chuva que se abateram em Interlagos quatro anos atrás), hoje houve tensão, emoção e dramaticidade em todas as 71 voltas da corrida de hoje, outra que entrou na história não apenas desta histórica temporada de 2012, como também da F1.

Ver Sebastian Vettel se sagrar tricampeão mundial ao final das quase duas horas de corrida era um resultado altamente esperado para quem chegou à São Paulo com treze pontos de vantagem sobre Alonso e com a Ferrari do espanhol claramente inferior a Red Bull de Vettel. Porém, por tudo o que aconteceu hoje, Sebastian não esquecerá esse título e a forma como ele conquistou. Na curva quatro da primeira volta, tudo parecia acabado para Vettel. Um toque de um destrambelhado Bruno Senna fez que o Red Bull de Vettel ficasse avariado e caísse para último. Além dos rombos na carenagem, estava claro o amassado no escapamento do carro de Vettel. Será que ele se recuperaria? Será que ele chegava? Vettel respondeu a essa pergunta com uma corrida magnífica em que apareceu na sexta posição em pouquíssimas voltas. A chuva, que sempre se fez presente em diferentes intensidades, fez da corrida um drama sem fim para os envolvidos no título. Vettel e Alonso escorregaram, saíram da pista e passaram por todos os apuros imaginados para quem lutava pelo título na última corrida. Para terminar, a Red Bull inexplicavelmente chamou Vettel para um segundo pit-stop. Nesse momento, todos corriam com pneus slicks, mas a garoa tradicional paulistana aumentava. E se transformou em chuva, fazendo com que Vettel, que fazia uma corrida  tranquila, voltar aos boxes e passou a atacar. Naquele momento, o campeonato caía no colo de Alonso. Mas Vettel ultrapassou Kobayashi de forma agressiva e depois passou Schumacher quando o heptacampeão sofria com seu péssimo Mercedes. Foi o suficiente. Mesmo com pedaços do seu carro voando ainda pelo incidente na primeira volta, Vettel era o mais rápido nas últimas voltas. Os que clamavam por chuva para ajudar Alonso devem ter se esquecido o quão bom Vettel é na chuva, vide sua primeira vitória numa encharcada Monza cinco anos atrás com um modesto Toro Rosso. Sebastian se igualou a Michael Schumacher e Juan Manuel Fangio ao ser tricampeão seguido. Ele tem o melhor carro? Ninguém tem duvida disso, mas fica a pergunta: se você fosse chefe de equipe  tivesse o melhor carro possível, você não gostaria de ter o melhor piloto possível? Assim é a Red Bull, que tem em Sebastian Vettel a certeza de que as criações espetaculares de Adryan Newey brigarão sempre na frente. E normalmente consegue a vitória.

A faixa da Ferrari "FER, você é o nosso número 1" mostra o quanto a equipe italiana sabe do gênio que tem em mãos. O fato de Alonso conseguir levar o título até a corrida final e perder por apenas três pontos, num sistema de pontuação em que os dez primeiros marcam e o vencedor ganha 25 pontos, demonstra bem que esse espanhol fez em 2012. Sendo bastante polêmico, mesmo sem o título, acho, sim, que Alonso fez mais esse ano do que Senna fez em 1993. A Ferrari não tinha condições de brigar pelo título e isso estava claro desde o início do ano, mas Alonso teimava em fazer corridas espetaculares ao longo desta temporada. Vencia quando ninguém esperava e sempre agarrava todas as oportunidades que surgiam. E assim levou a decisão do campeonato até o final, quase conseguindo o sonhado tricampeonato. Assim como em todas as corridas deste ano, Alonso teve que andar mais do que o carro e fazer das tripas, coração, para permanecer vivo na briga. Não deu. O segundo lugar, depois de largar em sétimo, era o máximo possível hoje para o espanhol, que sai cada vez mais forte, mesmo acumulando fracassos desde seu último título em 2006. E quem saiu forte também foi Felipe Massa. O brasileiro utilizou muito bem seu belo retrospecto em Interlagos para superar Alonso em todo o final de semana e mesmo parando na hora errada, conseguiu um emocionante pódio onde chorou copiosamente, repetindo o gesto de 2008. Esse pode ser um recomeço para Massa e 2013 inteiro tenha mais a cara da segunda metade de 2012, onde Felipe foi um piloto forte o tempo todo.

Porém, os protagonistas na disputa pelo título de 2012 estiveram longe da luta pela vitória em Interlagos e como sempre acontece quando uma corrida fica difícil e cheia de alternativas, Jenson Button se mostrou forte e venceu mais uma vez em 2012, tendo a honra de ter vencido a primeira e a última prova deste ano. O inglês andou próximo de Hamilton nas primeiras voltas e ultrapassou seu companheiro de equipe quando teve oportunidade. Button chegou a cair para terceiro, mas se beneficiou do toque entre Hamilton e um espetacular Nico Hülkenberg para então administrar a corrida até o fim. Mesmo não sendo tão espetacular quanto Hamilton, Jenson Button é extremamente eficiente e isso fica provado na pontuação, onde chegou apenas quatro pontos atrás de Hamilton. Porém, Lewis merecia uma despedida melhor na McLaren. O inglês lutou a prova toda pela vitória, mas acabou vítima involuntária de uma escorregada de Hulkenberg quando era ultrapassado pelo alemão e terminou a corrida numa situação que lhe foi bastante familiar este ano, com o carro arrebentado. Algumas corridas atrás Galvão Bueno disse que Hulkenberg era um piloto apenas 'comum' e que não tinha condições de substituir Massa na Ferrari. Muito provavelmente Nico não sabe dessa história, mas se soubesse deve ter dado uma resposta ao narrador global com uma atuação magnifica em Interlagos, uma pista em que o alemão parece se dar maravilhosamente bem. Com pista úmida, Hulkenberg foi sensacional e após ultrapassar Alonso, partiu para cima das duas McLarens, assumindo a primeira posição quando deixou Button para trás quando os dois se mantiveram corajosamente na pista com pneus slicks, mesmo com uma neblina persistente. Quando o safety-car foi a pista devido aos vários detritos na pista, Hülkenberg viu sua vantagem sobre o terceiro colocado se evaporar, mas nem assim o alemão se sentiu pressionado pelas duas McLarens. Seu erro quando ultrapassava Hamilton de volta na briga pela primeira posição se deu unicamente pela pista que ficava cada vez mais molhada e a punição foi altamente questionada, mas Hulkenberg, com pleno apoio de sua equipe, no qual se despediu hoje, ainda conseguiu um bom quinto lugar. Mas pelo o que fez hoje, Hulkenberg merecia, no mínimo, um pódio.

Com tantas intempéries, muita gente se sobressaiu e outros deixaram a desejar. Mark Webber chegou à frente de Vettel, mas nem de longe teve uma atuação digna de nota e por isso deverá ser, novamente, segundo piloto da Red Bull em 2013. Michael Schumacher se despediu dignamente em um carro terrível e foi o primeiro a cumprimentar Vettel quando saíram dos carros. Schummy deve saber que o cetro do automobilismo alemão está em ótimas mãos e que pode curtir a família tranquilamente. Kobayashi, outro que pode estar se despedindo da F1, fez uma corrida muito boa, onde correu próximo de Alonso e Vettel sem fazer nenhuma loucura, mas sua rodada nas voltas finais mostram bem o porquê Pérez, um piloto mais consistente, ter sido contratado pela McLaren e, mesmo com seu estilo espetacular, Koba está praticamente fora da F1. Os pilotos da Toro Rosso chegaram a andar nos pontos, mas apanas Ricciardo pontuou. Williams e Lotus tiveram corridas para esquecer, com Bruno Senna quase definindo o Mundial na primeira volta ao bater em Vettel e levar Sérgio Pérez no processo. Maldonado abandonou em um acidente na Curva do Sol que a TV não mostrou, enquanto Grosjean foi a primeira vítima da pista molhada. Raikkonen foi protagonista da cena mais curiosa dos últimos tempos da F1. Após sair da pista, Kimi tentou um atalho e acabou entrando numa zona sem saída! Di Resta causou o acidente que trouxe o safety-car que definiu o tricampeonato para Vettel e mesmo estando nos pontos, o escocês esteve longe de brilhar quanto seu companheiro de equipe na Force India. Nico Rosberg teve um pneu furado e por isso fez com que o safety-car entrasse pela primeira vez por causa dos detritos, mas o alemão teve outra corrida para esquecer. Mais atrás, de forma discreta, mas altamente dramática, Caterham e Marussia brigavam para saber quem era a melhor das nanicas. A Caterham necessitava quase de um milagre para superar a Marussia na luta pela décima posição no Mundial de Construtores, pois ela teria que chegar em 12º. Porém, numa corrida maluca, Vitaly Petrov fez ainda mais mais e conseguiu um 11º lugar, com Charles Pic, da Marussia, apenas 3s atrás! Foi de perder o fôlego e a Caterham conseguiu alguns milhões de dólares por muito pouco, enquanto a Marussia perdeu por apenas 3s...

E assim terminou uma das melhores temporadas da história da F1. Muita gente não consegue curtir a história passar pelos seus olhos e fica apenas lembrando de outras temporadas, particularmente nos anos 70 e 80, e só enxergam os pontos negativos de 2012, como se naquela época também não tivesse aberrações de regulamento ou carros e/ou pilotos ruins. Digo sem medo de ser feliz que 2012 foi a melhor temporada que já assisti e uma das melhores da história. Foram oito pilotos diferentes ganhando, corridas inesquecíveis (incluindo, logicamente, a de hoje), exibições de gala de pilotos consagrados como Lewis Hamilton, Jenson Button e Kimi Raikkonen, jovens pilotos se sobressaindo como Sérgio Pérez, Romain Grosjean (apesar dos pesares...) e Nico Hülkenberg, outros pilotos dando a volta por cima (Felipe Massa), a despedida definitiva de Michael Schumacher e várias equipes vencendo Que vimos também dois monstros se digladiarem até o último momento. Sebastian Vettel e Fernando Alonso mereciam ganhar, mas no esporte, só um vence. E venceu Vettel. Parabéns a ele, pois!

4 comentários:

Vinicius disse...

Correção

O Toro Rosso que pontuou foi o de Vergne e não o do Ricciardo!

RodIshiCi disse...

Não sei... que Alonso dirigiu muito bem nessa temporada, é fato. Mas falar que ele correu mais que o carro permitia nessa última prova, discordo, já que o companheiro de equipe dele precisou abrir o caminho duas vezes pra que Fernando chegasse na frente, e isso que já largou atrás por ter feito um tempo inferior.

João Carlos Viana disse...

Obrigado Vinicius, é que escrevi esse post logo depois da corrida e estava animado demais para ver qual Toro Rosso pontuou! rsrsrs

João Carlos Viana disse...

Aí é que está RodIshiCi...

Depois de um longo e tenebroso inverno, Massa também andou mais do que o carro. Coisa que Alonso fez todo o ano!