terça-feira, 25 de outubro de 2011

História: 35 anos do Grande Prêmio do Japão de 1976

Após as duas corridas norte-americanas, o campeonato seria decidido entre as duas estrelas de 1976 num novo cenário da F1. O circuito de Monte Fuji era a grande novidade do calendário com um circuito interessante no sopé do monte sagrado japonês, garantindo para a F1 sua primeira visita oficial ao oriente, além do calendário passar das tradicionais 16 corridas para 17. O terrível acidente de Lauda marcou um divisor de água da temporada e o austríaco perdia paulatinamente sua grande vantagem obtida ao longo do ano para James Hunt, que soube capitalizar as corridas em que Lauda não participou e sua cuidadosa (e corajosa) volta à F1. Por sua vez, Lauda já era um herói por estar correndo ainda com as cicatrizes do seu acidente e tinha certa torcida de todos na F1. Enquanto isso, James Hunt chegava a Tóquio alguns dias antes para, junto com Barry Sheene, bicampeão mundial de motovelocidade e também um playboy inglês, fazerem uma festa de arromba num hotel na capital japonesa. Surubas à parte, Lauda e Hunt estavam separados apenas por três pontos quando os primeiros treinos foram realizados em Monte Fuji.

A disputa pela pole entre Lauda e Hunt teve a intromissão da Lotus de Mario Andretti, que conseguiu acertar o difícil carro construído por Colin Chapman e melhorava de rendimento a olhos vistos ao longo do ano. Oito anos após sua surpreendente primeira pole, Andretti voltava a largar na ponta de uma corrida de F1, tendo ao lado na primeira fila James Hunt, que nesse primeiro round derrotou Lauda por 0.28s. Porém, se as posições se repetissem na corrida, Lauda seria o campeão por um ponto... A surpresa foi o carro japonês da Kojima, pilotado pelo também japonês Masahiro Hasemi, ficar entre os dez primeiros do grid, essa que foi a primeira corrida dos pneus Bridgestone na F1.

Grid:
1) Andretti(Lotus) – 1:12.77
2) Hunt(McLaren) – 1:12.80
3) Lauda(Ferrari) – 1:13.08
4) Watson(Penske) – 1:13.29
5) Scheckter(Tyrrell) – 1:13.31
6) Pace(Brabham) – 1:13.43
7) Regazzoni(Ferrari) – 1:13.64
8) Brambilla(March) – 1:13.72
9) Peterson(March) – 1:13.85
10) Hasemi(Kojima) – 1:13.88

No dia 24 de outubro de 1976, Monte Fuji viu o tempo mudar em 180º e o clima quente e agradável dos treinos se transformou numa chuva torrencial no domingo. Mais de 150.000 torcedores lotaram o circuito de Fuji na esperança de ver a decisão do campeonato mundial, mas os pilotos estavam temerosos em ter que largar em condições tão ruins. Reuniões foram realizadas e a largada era constantemente atrasada, na vã esperança de que as condições melhorassem. Na verdade, o tempo escurecia perigosamente e a corrida corria o sério risco de ser cancelada, mas alguns pilotos, como Peterson, Brambilla, Watson, Tom Pryce e Alan Jones não queriam o cancelamento da prova. Além, é claro, de Bernie Ecclestone em pessoa pedir que a largada fosse dada, para não atrapalhar as transmissões de TV. Exatamente às três horas da tarde, uma hora e meia depois do combinado, a luz verde foi dada para os vinte e cinco carros começassem a corrida, num momento em que a chuva não era tão forte, mas nem por isso a pista estava menos encharcada. Mostrando o quão determinado estava em vencer o título mundial, Hunt larga melhor do que Andretti e pula na frente, ficando na primeira posição ainda antes do final da reta dos boxes. Watson também larga bem e pula para segundo, à frente de Andretti. Contudo, Watson tem problemas ainda na primeira volta e cai várias posições.

Enquanto isso, e mais importante em termos de campeonato, Niki Lauda cruza a primeira volta apenas em décimo e na volta seguinte o austríaco entra nos boxes lentamente de forma inesperada. A Ferrari pensava que havia algum problema com o carro, mas Lauda simplesmente abandona a corrida por motivos de segurança. “Me pagam para correr, não para pular pela janela,” falaria Lauda sobre os motivos do seu abandono voluntário, seguido mais tarde pelos brasileiros José Carlos Pace e Emerson Fittipaldi. Apesar de a pista estar praticamente impraticável, os demais carros ainda corriam pela pista encharcada de Fuji e a Ferrari ficou uma fera pela atitude de Lauda, o chamando inclusive de covarde, praticamente esquecendo-se do que o austríaco fez nos últimos meses, ao sair do leito da morte praticamente direto para o cockpit da Ferrari. Enquanto nos boxes da McLaren os mecânicos comemoravam, Hunt liderava com tranqüilidade na frente, mesmo sabendo que um terceiro lugar lhe bastaria para ser campeão. Vittorio Brambilla, que havia conquistado sua única vitória na F1 debaixo de chuva um ano antes, fazia uma ótima prova e mesmo tendo que trocar um pneu defeituoso ainda na quinta volta, o italiano da March fazia uma corrida forte de recuperação. Enquanto Hunt aumentava sua vantagem sobre Andretti, Brambilla aumentava seu ritmo e do oitavo lugar que ocupava após sua parada nos boxes, o italiano conseguiu ultrapassar Andretti pelo segundo lugar na 16º volta! Imediatamente a diferença de 14s que Hunt tinha sobre o italiano desapareceu e como havia ocorrido no Grande Premio da Áustria de 1975, Brambilla atacava Hunt pela vitória.

Contudo, Vittorio Brambilla não era exatamente um piloto de paciência e suas peripécias entraram para o folclore da F1 em todos os tempos. Em apenas seis voltas Brambilla encostou em Hunt, que nem precisava se matar para se manter na liderança, já que o piloto da McLaren pensava unicamente no título, mas o italiano tentou a ultrapassagem logo na primeira oportunidade que surgiu e acabou levando o xis de Hunt. Para piorar, Brambilla acabou rodando e caiu para o quarto lugar. Era Vittorio Brambilla no seu estilo mais puro! Para o menor entretenimento da corrida, Brambilla acabaria abandonando com o motor quebrado, mas Jochen Mass fazia uma boa corrida e após ultrapassar Andretti, assumia a segunda posição, formando uma dobradinha da McLaren. Além de estar na liderança, Hunt agora tinha certeza que teria um escudeiro caso as coisas piorassem para o seu lado. E foi exatamente isso que acabou acontecendo!

Primeiro, Mass abandonou na 36º volta após sofrer um acidente. A chuva havia parado nesse momento e um trilho seco começava a se formar. Hunt via de longe a briga pela segunda posição se estabelecer entre Patrick Depailler, Tom Pryce e Mario Andretti, com Pryce tendo que abandonar com o motor quebrado. A pista fica bem traiçoeira neste momento, pois havia um claro trilho seco, mas muito molhado fora dela. Um erro seria fatal. Hunt cometeria outro tipo de erro ao forçar seus pneus para chuva no trilho seco e o resultado foi enorme desgaste dos pneus dianteiros do inglês. Correndo com a cabeça e tentando resfriar seus pneus quando podia, Depailler rapidamente descontou a desvantagem de 14s que tinha para Hunt e o ultrapassou, não demorando três voltas para Andretti fazer o mesmo. O terceiro lugar ainda garantia o título para Hunt, mas seu desempenho tinha caído de tal forma, que ele começava a ser ameaçado por Alan Jones e Clay Regazzoni, da Ferrari. O time italiano mandou Rega partir para cima, mas para garantir o terceiro lugar, a McLaren resolveu trazer Hunt para os boxes e trocar apenas os pneus dianteiros. Seria apenas uma parada de rotina, mas o nervosismo faz a McLaren se atrapalhar toda e 31s são gastos para trocar apenas dois pneus! Hunt vai para a pista louco da vida, pensando que o título tinha ido para o lixo tão perto do final, enquanto os mecânicos da Ferrari comemoram a desventura de Hunt. Lá na frente, Depailler tem um pneu furado e Andretti assume a ponta, enquanto James Hunt inicia uma das mais empolgantes recuperações já vistas na história da F1. Caindo para o sexto lugar, faltando apenas quatro voltas para o final, Hunt faz jus o seu nome e caça todos seus adversários. Jones assumia por pouco tempo a segunda colocação, mas roda e é ultrapassado por Regazzoni. Com pneus novos e tendo perdido menos tempo que Hunt, Depailler ultrapassa Jones e Regazzoni em apenas uma volta, deixando os dois para Hunt. O inglês parte para cima de Jones e o ultrapassa de forma agressiva, mas todos se perguntavam como seria a disputa com Regazzoni, um dos pilotos mais agressivos e duros que a F1 já viu. De forma surpreendente, Rega praticamente deixou Hunt passar e assumir o terceiro lugar, ainda sendo ultrapassado por Jones. Aquela era a última corrida de Regazzoni na Ferrari e muito se falou que o suíço deixou Hunt passar como forma de protesto pela forma como fora tratado pelo time de Maranello em 1976.

Tendo perdido pouco tempo durante a corrida, mas andando sempre entre os primeiros, Mario Andretti vencia novamente na F1 depois de muitos anos e a Lotus terminava um incomodo jejum sem vitórias, além de fazer Chapman não desistir da F1, pois ele disse no começo do ano que abandonaria a categoria se não vencesse uma única corrida na temporada. Além da pista molhada, a noite já estava caindo em Fuji e o pódio festejando Andretti foi praticamente no escuro... Hunt cruzou a linha de chegada em terceiro, mas o inglês estava tão adrenalizado que não percebeu que havia ganho o título e após parar o carro, ele quase partiu para a briga com Teddy Meyer, chefe da McLaren, que o convenceu a parar no final da corrida. Mais calmo, James Hunt pôde finalmente comemorar um dos títulos mais emocionantes e dramáticos da história, com o inglês derrotando Lauda por apenas um ponto, a menor diferença de todos os tempos até ali. Muitos dizem que James Hunt foi um campeão sem brilho, que só venceu porque tinha um carro acertado por Emerson Fittipaldi até 1975 e pelo azar de Lauda, mas o inglês mostrou várias virtudes no seu ano de triunfo e ele definitivamente soube aproveitar as oportunidades que surgiram e agarrou com força. Num campeonato tão polêmico e cheio de fatos históricos, de final tão apertado, disputado entre dois personagens tão antagônicos, não é surpresa que um filme esteja sendo rodado sobre a temporada 1976.

Chegada:
1) Andretti
2) Depailler
3) Hunt
4) Jones
5) Regazzoni
6) Nilsson

5 comentários:

MAURO GUERREIRO disse...

Assisti essa corrida. Vários fatores interessantes marcaram essa prova. 1) A chuva torrencial que atrasou a largada em 1 1/2h. Aqui no Brasil estava marcado para 2:00hs e começou por volta de 3:30hs. Eu e mais dois amigos esperávamos enquanto conversávamos e bebíamos uísque. 2) Durante a espera, enquanto Lauda estava muito tenso, Hunt bebia Coca-Cola sentado em uma bancada. 3) No meio da indecisão larga não larga e com a insistência do Bernie para largar, um piloto se ofereceu para testar a pista e ver se havia condições. Foi o louco Vittorio Brambilla, que adorava correr na chuva, e ali eu dei uma gargalhada, já sabendo que iria haver a largada. Após dar uma volta, ele parou nos boxes e disse que a pista tava jóia. kkk. Na verdade tava um charco. 4) Um dos fatos mais sensacionais desta prova. Largando em 10º, um autêntico Kamikaze vinha lá de trás se equilibrando como podia, comendo todo mundo debaixo de chuva. Era o piloto convidado, Masahiro Hasemi da equipe Kojima, que chegou a disputar posição de pódio, mas a pista começou a secar e seu carro perdeu a condição de disputa, terminando em 11º. 5) A troca inesperada de pneus do Hunt e a excessiva demora nos boxes. 6)A curiosa e fácil ultrapassagem de Hunt por Regazzoni, sem nenhuma resistência por parte do agressivo suíço, que fazia sua última corrida na Ferrari. Especulou-se que ele teria se vingado da Ferrari por não o priorizar em nenhum momento, enquanto aguardava Lauda se recuperar de seu terrível acidente.
Bons tempos de F1.

MAURO GUERREIRO disse...

Observação esquecida. Esta foi a única participação de Masahiro Hasemi na F1.

MAURO GUERREIRO disse...

Ah .. E Masahiro fez a melhor volta da prova .. rs ..

MAURO GUERREIRO disse...

Pesquisei um pouco e parece que o piloto japones que chegou a andar em terceiro foi o Kazuyoshi Hoshino da Tyrrell. Ele teria largado em 21º.

João Carlos Viana disse...

Obrigado Mauro pelos relatos de quem assistiu a corrida ao vivo naquele dia histórico!