Hoje tive a sensação de ter presenciado uma dos grandes
momentos da história da F1 numa corrida de tirar o fôlego do começo ao fim. De
grandes pilotos que serão lembrados para sempre como gênios da velocidade se
espremendo na difícil e bonita pista de Valencia. Pista essa, que até o ano
passado só tinha tido corridas chatas, mas que esse histórico 2012 vem para
reverter toda a lógica. Inclusive, fazendo um normalmente frio Fernando Alonso
comemorar como nunca vitória improvável em sua casa, após uma corrida
monumental do espanhol, saindo da décima primeira posição rumo a um triunfo
consagrador e ajudando seu país em crise dar um sorriso frente às dificuldades
diárias. Foi uma corrida magnífica, decidida na pista, com homens lutando a
todo o momento em manter seu espaço num dia em que a F1 lembrará por muitos
anos.
Não deixou de ser surpreendente a prova em Valencia ter sido
tão boa. O histórico não ajudava a prever uma corrida tão cheia de reviravoltas
e ultrapassagens como a de hoje. Sebastian Vettel parecia que ganharia pela
terceira vez seguida vindo da pole, mas um problema em seu carro abriu as
portas para Fernando Alonso comprovar que está mesmo na história da F1. Assim
como Jenson Button ano passado em Montreal, Alonso mostrou hoje uma das
melhores apresentações individuais da história da F1 com um começo de corrida
arrebatador, com uma ótima largada e várias ultrapassagens. Alonso também soube
usar a estratégia, a mesma que o atrapalhou tanto no Canadá, para ganhar
posições e aparecer em terceiro lugar na entrada do safety-car. Na relargada,
ultrapassou com vigor um grande Romain Grosjean e se foi ajudado pela quebra do
dominante Vettel, Fernando controlou a corrida a partir de então com a maestria
do grande campeão que é. As imagens após a bandeirada emocionaram a todos, pois
apesar de todos os seus defeitos, a F1 ainda é capaz de emocionar a todo um
povo sofrido com uma crise histórica e Alonso fez questão de mostrar que
vitórias como essas são capazes de alegrar até o mais triste coração. Para
melhorar, Alonso pode ter dado um passo enorme rumo ao título. Após a corrida
no Canadá, o campeonato se afunilava para uma disputa entre Hamilton, Alonso e
Vettel, com o primeiro na liderança. Porém, com o abandono dos seus dois
maiores rivais, Alonso agora tem uma folga de vinte pontos para o seu mais
próximo perseguidor, Mark Webber. O tricampeonato agora é mais que possível!
Felipe Massa vinha mais ou menos na balada de Alonso, mas como ocorria nos
tempos da relação conturbada Schumacher-Barrichello, todos os problemas caíram
na cabeça do brasileiro e um toque em Kobayashi pôs tudo a perder para o
ferrarista. Massa teve que engolir ter que tomar uma volta de Alonso mais uma
vez, mas desta vez, foram as circunstâncias que fizeram outro mal resultado de
Massa.
Como Alonso acabou com a sequencia histórica de pilotos
diferentes vencendo nas primeiras corridas no campeonato, talvez a Lotus tenha
menos pressão, mas ainda assim os carros auri-negros são os favoritos para
tirar o cabaço (como se diz aqui no Ceará) e vencer pela primeira vez no ano.
Favoritos a fazê-lo em Valencia, a Lotus bateu na trave novamente com Kimi
Raikkonen tendo outra grande exibição e chegando em segundo, mas o grande
piloto da Lotus hoje foi Romain Grosjean. Apesar da Globo secar demais o
francês, em nenhum momento Grosjean errou e parecia capaz de estragar a festa
dos espanhóis e vencer a corrida nas ruas valencianas. Grosjean largou bem e
ultrapassou de forma firme Maldonado na primeira curva, passando a perseguir
Hamilton até passa-lo quando já tinha uma enorme desvantagem para o líder
Vettel. Com o safety-car, Grosjean pode encostar no líder Vettel e até
ataca-lo, mas o francês acabou ultrapassado por Alonso, mas nunca saiu de perto
do espanhol e com as lembranças ainda vivas de como economizou pneus em
Montreal, a previsão era de um ataque nas voltas finais, mas infelizmente esse
ataque não veio por uma quebra mecânica da Lotus de Romain. Porém, Raikkonen
diminuiu um pouco a frustração com outra pilotagem segura e sem grandes
arroubos de talento, mas com muita eficácia. O finlandês estava claramente
atrás de Grosjean a corrida todo, mas quando o companheiro abandonou, soube
atacar Hamilton quando este ficou sem pneus e chegou novamente em segundo
lugar, levando a Lotus a encostar na McLaren no segundo lugar no Mundial de
Construtores. Ainda falta um final de semana em que tudo se encaixe para a Lotus
vencer e este momento ainda deverá acontecer este ano.
Outro momento histórico da corrida de hoje foi o primeiro
pódio de Michael Schumacher em sua volta à F1. O alemão largou ao lado de
Alonso hoje, mas não teve a mesma volúpia do piloto da Ferrari, mas soube
utilizar a estratégia que tanto o ajudou a vencer títulos com a Ferrari para
ser o piloto mais rápido no final e fazer várias ultrapassagens para garantir
um terceiro lugar emocionante. Está claro que Schummy não tem mais o mesmo
vigor do seu auge na F1 e que a aposentadoria definitiva está próxima, mas o
alemão mostrou que ainda pode vislumbrar os bons tempos. Nico Rosberg mal
apareceu na TV e mesmo com uma estratégia parecida com a de Schumcher, o alemão
não teve a mesma gana do companheiro de equipe na hora de ultrapassar e por
isso ficou para trás. Largando em 19º, marcar pontos era um objetivo até difícil
para Mark Webber, mas o australiano fez muito mais e por muito pouco não beliscou
um pódio, mas o que ele fez não deixou de ser um ótimo resultado. Na verdade,
Webber só não ultrapassou Schumacher na volta final por causa da bandeira
amarela provocada pelo incidente entre Hamilton e Maldonado na volta anterior,
que lhe garantiu mais duas posições, mas o impediu de ganhar outra. Porém,
Webber marcou pontos suficientes para pular ao segundo lugar do campeonato,
mesmo estando vinte pontos e não ter repetido, ainda, o brilhantismo de 2010.
Vettel era o virtual vencedor da corrida quando abandonou tristemente pouco
após a saída do safety-car. O alemão chegou a estar 20s na frente do segundo
colocado Grosjean e com dois campeonatos nas costas, a chance de segurar Alonso
era grande mesmo correndo na casa do adversário, mas o carro da Red Bull, que
tinha se mostrado tão confiável ano passado, deixou a equipe na mão como fez
algumas vezes em 2010, irritando Vettel e fazendo Adryan Newey botar as mãos na
cabeça.
As voltas finais teve um Lewis Hamilton perdendo ritmo de
forma abrupta, provavelmente por causa dos pneus e isso fez com que Maldonado
encostasse no inglês e um polêmico incidente acontecesse. Porém, novamente a
McLaren errou num pit-stop de Hamilton, fazendo o inglês sair de sua segunda
parada atrás de Alonso. Num momento de renovação de contrato, isso poderá
pesar. Hamilton zerou pela primeira vez no ano e a forma como ficou após bater
no muro mostrou não apenas a frustração pela batida, como também a chance do
bicampeonato estar indo embora lentamente mais uma vez. Button pontuou
novamente, o que não deixa de ser uma evolução, mas o inglês esteve longe de
brilhar e mais uma vez ficou devendo! Maldonado fazia uma corrida correta até o
incidente com Hamilton, que poderá acabar lhe valendo uma punição por tempo. O
venezuelano levou várias ultrapassagens de forma até consciente, pois sabia que
lutar demais poderia mais prejudicar do que ajuda-lo, mas a forma como bateu em
Hamilton acabou estragando não apenas a obtenção de bons pontos, como poderá acabar
por puni-lo mais uma vez, que acabou vitimando Bruno Senna, a meu ver,
injustamente, em outro arroubo de Kobayashi. O brasileiro vinha fazendo uma
prova segura, no mesmo ritmo de Schumacher e Webber, sendo que estava à frente
de ambos, e provavelmente pontuaria de forma consistente até encontrar Koba
pela frente e ser punido, destruindo sua boa corrida. A Force India foi
consistente ao extremo e marcou bons pontos com seus dois pilotos, sendo que
Hulkenberg passou a prova praticamente inteira na frente de Paul de Resta,
quando o normal era o contrário. A entrada do safety-car pode ter estragado a
estratégia do escocês, que provavelmente pararia uma vez menos.
Essa história de mito para Kamui Kobayashi está se tornando
mais folclórico do que sério. Que o japonês da Sauber é rápido e agressivo,
ninguém duvida, mas a realidade é que ele está sendo amplamente superado por
Sérgio Pérez, que é tão rápido e muito mais eficiente, e seus acidentes fazem
nos lembrar do também folclórico e simpático Satoru Nakajima. Pérez marcou
pontos mais uma vez, mesmo largando lá atrás, enquanto Kobayashi abandonou após
tantas pancadas nos brasileiros. A Toro Rosso fez outra corrida para esquecer e
mesmo Daniel Ricciardo chegando a ficar em quarto devido a estratégia diferente
de pneus na relargada da corrida, o time estava mesmo brigando com a Caterham,
mostrando a involução da equipe. Por sinal, Verge fez outra corrida terrível e trouxe
a entrada do safety-car ao provocar um acidente bobo com Kovalainen. A Caterham
teve uma prova atribulada, mas chegou a ver Petrov em décimo por algumas
voltas, até o russo se achar mais tarde com Ricciardo, em outra briga Caterham
x Toro Rosso. O time verde já está no mesmo ritmo da filial da Red Bull, o que
já é motivo para comemorar. A Marussia teve apenas Charles Pic para enfrentar a
ascendente HRT na luta para se livrar da última posição e o francês acabou
conseguindo superar os carros espanhóis, mesmo com dificuldades. Glock,
coitado, não correu por uma vulgar caganeira!
Valencia hoje viveu momentos de Interlagos em 1993, quando o
povo levantou nos braços Ayrton Senna após uma vitória improvável. Hoje, Alonso
fez isso e ainda se garantiu como favorito ao título numa campanha marcada pelo
talento, inteligência e oportunismo do espanhol, que vem cavando seu nome na
história da F1. Para quem duvidava que estamos vendo uma melhores temporada da
história da F1, hoje pode ter sido uma resposta, mesmo com Alonso disparando no
campeonato. Hoje vimos brigas de altíssimo nível. Valencia nos mostrou uma
corrida histórica e poderemos dizer mais tarde, daqui a alguns anos, que vimos
um Alonso iluminado, um Raikkonen soberbo, um Schumacher agressivo, um Webber
admirável, um Vettel dominante...
Um comentário:
Não foi sensação não, foi a prova de que nem só de passado vive esta categoria.
A corrida foi das maiores de todos os tempos.
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