segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Ignazio


Após Alberto Ascari, a Itália nunca teve sucesso em termos de Campeões Mundiais, mesmo com alguns de seus representantes correndo pela Ferrari nos anos seguintes. Alguns obtiveram algum sucesso, como Lorenzo Bandini e Ludovico Scarfiotti, mas nosso personagem tinha tudo para alcançar ou até mesmo superar seus compatriotas mortos. Ignazio Giunti fez sua carreira em carros esporte, mas sua passagem curta e marcante na F1 o fez se tornar uma verdadeira promessa italiana, mas o destino não quis que Giunti, dono de um dos capacetes mais exóticos e bonitos da história do automobilismo, não chegasse ao estrelato para onde se encaminhava. Fazendo quarenta anos de sua trágica morte, vamos ver um pouco da carreira de Giunti.

Ignazio Giunti nasceu no dia 30 de Agosto de 1941 em Roma, em meio a Segunda Guerra Mundial. De uma rica família romana, Giunti pôde desfrutar de tudo do bom e do melhor durante sua juventude, inclusive sua grande paixão: dirigir o mais rápido possível suas Alfas. Em 1966 Ignazio começou sua carreira no automobilismo numa categoria muito forte e tradicional na Europa, a Subida de Montanha, ainda utilizando sua Alfa Romeo, sua marca preferida. Rapidamente o italiano conseguiu sucesso e em 1967 ele se tornou Campeão Europeu de Subida de Montanha e isso chamou a atenção da própria Alfa Romeo, que o contratou através do seu braço automobilístico, a Autodelta em 1968. Correndo no Campeonato de Esporte-Protótipo com o modelo T33, Giunti consegue sucesso imediato, correndo sempre ao lado do compatriota Nanni Galli. Ele termina a famosa Targa Florio em 2º lugar e, mais importante, completa sua primeira 24 Horas de Le Mans em 4º lugar no geral, vencendo em sua classe, lhe garantindo a vitória no Criterium des Cévennes. No final de 1968, Ignazio Giunti acabaria por se tornar Campeão Italiano de Esporte-Protótipo pela equipe oficial da Alfa Romeo.

Isso chamou a atenção de Enzo Ferrari, ávido em contratar pilotos italianos para o Campeonato de Esporte-Protótipo e substituir ídolos como Bandini e Scarfiotti, mortos recentemente. A dupla Giunti/Galli permaneceu com a Alfa Romeo em 1969, mas a temporada foi terrível, com vários abandonos e com o interesse da forte equipe da Ferrari, os dois não pensaram duas vezes em se transferir para o time de Maranello em 1970. Foi um casamento que deu certo quase que imediatamente. Logo na primeira corrida de Giunti com a Ferrari, ele venceu a tradicional 12 Horas de Sebring, utilizando o belo modelo 512S. Após ter chegado em segundo dois anos antes na Targa Florio, o duo Giunti/Galli, agora melhor equipado, venceu os Porsches e se consagrou na tradicional corrida de estrada italiana. Ignazio Giunti se destacava no Campeonato de Esporte-Protótipo e a Ferrari pensou em dar uma oportunidade ao italiano na F1. Naquele momento, a Ferrari se desdobrava nos dois fortes campeonatos (F1 e Mundial de Esporte-Protótipo) e isso por muitas vezes acabou atrapalhando o time, pois a divisão de forças fazia com que o time não obtivesse muito sucesso em ambos os campeonatos. Na F1, a Ferrari decidiu investir em um único carro para Jacky Ickx, mas as três primeiras etapas de 1970 somente com o belga não deu os resultados esperados e Ickx abandonou as três primeiras corridas. Porém, um novo carro estava para ser estreado e havia uma ótima expectativa para a segunda metade do campeonato, mas Ickx necessitava de uma referência. Então a Ferrari decidiu numa solução caseira e recrutou seus dois pilotos mais promissores para dividir a equipe de F1 com Ickx. O primeiro foi o ítalo-suíço Clay Regazzoni, que tinha corrido pela Ferrari na F2 em 1969 e mesmo tendo contrato com a Tecno na categoria de acesso, participava de algumas provas no Mundial de Esporte-Protótipo com a Ferrari e mostrava sua garra e agressividade em excesso.

O outro era Ignazio Giunti e seus ótimos resultados pela Ferrari pelo Mundial de Esporte-Protótipo. Haveria uma esquema de revezamento e Giunti foi o escolhido para correr na famosa, reformada e perigosa pista de Spa, onde fez sua estréia na F1. E que estréia! Largando em 8º, Giunti levou sua arisca Ferrari ao 4º lugar, marcando seu primeiros pontos logo em sua primeira corrida na F1. Tudo levava a crer que Giunti poderia ser facilmente o piloto da vez na Ferrari, mas na Holanda, a etapa seguinte do campeonato, era a vez de Clay Regazzoni mostrar suas habilidades e o suíço não se fez de rogado ao emular o 4º lugar de Giunti. Mais adaptado aos monopostos, com uma agressividade que beirava a selvageria e com a Ferrari cada vez melhor em 1970, Regazzoni foi tomando conta da disputa com Giunti. Após outro 4º lugar na Inglaterra, Regazzoni cedeu seu lugar a Giunti e o italiano não repetiu o desempenho da estréia e foi apenas o 11º na França, graças a um demorado pit-stop para consertar um problema no cabo do acelerador de sua Ferrari. Contudo, a equipe italiana estava satisfeita com seus dois pilotos e nas duas próximas corridas, Áustria e Itália, inscreveu Giunti e Regazzoni ao lado de Ickx. Giunti não fazia um mal papel, mas Regazzoni se sobressaiu nessas duas corridas, com um 2º lugar e uma vitória em Monza, enquanto Giunti chamaria mais atenção por uma das fotografias mais conhecidas da história da F1. Na aproximação da curva Parabólica, Emerson Fittipaldi erra a freada e sobe na traseira de Giunti, destruindo a Lotus que era de Rindt.

A prova em Monza seria a última de Giunti na F1. Regazzoni, mesmo começando o campeonato em andamento, terminou o certame em 3º e foi o escolhido pela Ferrari para ser o 2º piloto da escuderia em 1971. Porém, Giunti correria em algumas provas mais importantes, principalmente porque Mario Andretti, o 3º piloto, ainda se concentrava mais nos seus compromissos nos Estados Unidos. Ignazio Giunti passaria a se concentrar mais no Mundial de Esporte-Protótipo e a briga encardida contra as Porsche da equipe de John Wyer. A primeira prova seria os 1000 km de Buenos Aires, logo no começo do ano, em 10 de janeiro de 1971. Foi na tradicional pista portenha que Ignazio Giunti morreria num dos acidentes mais bizarros e impressionantes da história do automobilismo mundial.

Correndo ao lado de Arturo Merzario, Giunti foi designado para fazer a primeira perna da longa corrida e o italiano vinha nas primeiras posições. Apenas na 36º volta, Jean Pierre Beltoise ficou sem combustível faltando apenas 200m da entrada dos boxes. Como era uma corrida longa, o francês não pensou duas vezes e passou a empurrar seu Matra MS660 rumo aos boxes. Eram, definitivamente, outros tempos. O problema para Beltoise era que a última curva era um aclive e o francês encontrava muitas dificuldades em empurrar seu pesado bólido, passando a fazer um irresponsável zigue-zague pela pista, que foi pouca sinalizada pelos comissários. Se aproximando da reta dos boxes, vinham duas Ferraris, com Mike Parkes (uma volta atrás) logo à frente de Giunti. O inglês desviou da Matra de última hora, pela grama, mas Giunti, com a visão encoberta, não teve chances e atingiu a traseira da Matra em cheio, com Beltoise se salvando por milagre. A Ferrari imediatamente se transformou numa bola de fogo, se arrastando pela reta dos boxes. Merzario, como faria cinco anos mais tarde em Nürburgring com Niki Lauda, saiu correndo e enfrentou o fogo para tirar o corpo desfalecido de Ignazio Giunti. Porém, era tarde demais. O forte impacto com a traseira da Matra tinha sido suficiente para matar Ignazio Giunti, aos 29 anos de idade.

O mundo inteiro ficou horrorizado com a morte de Giunti e imediatamente apontou o dedo para Beltoise. O francês foi preso e acusado de homício culposo, sendo libertado sob fiança, desde que ele estivesse a disposição de um tribunal argentino em dois meses. Na Itália exigiu-se que Beltoise nunca mais corresse, mas Beltoise acabou suspenso por seis meses das corridas. Apesar da irresponsabilidade em empurrar seu carro em zigue-zague pela pista, Beltoise teve várias atenuantes em seu julgamento. Primeiro, ele não foi impedido pelos comissários argentinos de empurrar seu carro rumo aos boxes e além disso, não havia nenhuma sinalização no local. Mike Parkes, que desviou da Matra no último momento, confirmou isso. E outro detalhe foi que Beltoise passou duas voltas tentando empurrar seu carro, ou seja, teoricamente as duas Ferraris já tinham visto o esforço do francês outras duas vezes. No final da investigação, a FIA decidiu que a partir daquele momento estava proibido de se empurar carros rumo ao boxe, com o piloto sendo excluído imediatamente da corrida quando ficar parado no meio da pista. Infelizmente, isso não veio a tempo de salvar a vida de Ignazio Giunti, que recebeu algumas homenagens post-mortem, como um busto no circuito de Vallelunga, próximo a sua Roma natal. Uma justa referência a um jovem piloto que teria um belo futuro pela frente.

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