domingo, 21 de setembro de 2008

Kiki


O mineiro é conhecido pelo seu jeito discreto e determinado de ser. Essas duas qualidades podem muito bem exemplificar quem é Cristiano da Matta. Filho de um dos grandes pilotos da década de 70 no Brasil, Kiki se tornou um excelente piloto e se não conseguiu uma grande performance na F1, muito por culpa do carro, Da Matta foi o grande destaque da CART em seus momento agonizantes. Após um enorme susto após sua frustrada passagem pela F1, Cristiano volta aos poucos ao automobilismo, sua grande paixão, juntamente com o rock e o ciclismo. Completando 35 anos nessa semana, vamos conhecer um pouco mais da carreira dessa grande estrela, mas de coração simples.

Cristiano Monteiro da Matta nasceu no dia 19 de setembro de 1973 em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais. Como não poderia deixar de ser, o gosto pelo automobilismo de Cristiano começou bastante cedo, mas no seu caso, houve um algo mais. Filho da lenda Toninho da Matta, Kiki passou sua infância e adolescência se inspirando no pai, que vencia seguidos campeonatos de turismo pelo Brasil. Quando tinha 15 anos, Da Matta tinha decidido que queria ser piloto de corridas, mas Toninho estava reticente. Ele sabia mais do que ninguém que correr no Brasil era muito difícil e tentava outros esportes para o pequeno Cristiano. Da Matta insistiu tanto que seu pai comprou um kart e formou uma equipe para que Cristiano pudesse correr e logo em sua estréia, Kiki venceu sua primeira prova! No final do ano Da Matta venceria o Campeonato Mineiro de kart e iniciaria um prodigiosa carreira no kartismo nacional.

Mesmo com relativa pouca experiência, Cristiano pulou para a F-Ford nacional em 1993. Eram tempos em que o automobilismo brasileiro tinha várias categorias de base revelando jovens pilotos para a F1. Era uma época sortida de grandes pilotos com chance de sucesso. Diferente de hoje... Graças aos seus ótimos resultados no kart, Kiki pôde estrear na tradicional equipe Texaco/Petropólis, onde teria que enfrentar pilotos como Renato Russo e Max Wilson. Assim como aconteceu em sua curta carreira, Da Matta mostrou serviço logo de cara e conquistou o campeonato com quatro vitórias e quatro poles. Seguindo o ritmo natural em sua carreira, Da Matta subiu para a F3 Brasileira, que estava em crise graças a separação com a F3 Sul-Americana. Mesmo com poucos carros na pista, Da Matta teria que enfrentar grandes pilotos que teriam muito sucesso no futuro, como Hélio Castroneves, Ricardo Zonta e Bruno Junqueira.

Da Matta corria pela equipe Cesário e durante o ano o seu principal adversário seria Castroneves, que corria pela Amir Nasr. Foi uma disputa de alto nível e novamente Da Matta mostrava o seu ritmo avassalador com mais um título com quatro vitórias e sete poles. De repente, o automobilismo tinha ficado pequeno demais para Cristiano e, ao contrário do seu pai, resolveu tentar a vida na Europa, pulando para a conceituada F3 Inglesa. Com 21 anos e correndo numa equipe pequena, pela primeira vez em sua carreira no automobilismo Cristiano não se torna campeão, terminando o certame em oitavo, mas com uma vitória. Mesmo podendo ficar mais um ano na ilha e tentar ser campeão inglês de F3, Kiki resolve dar mais um passo na carreira e sobe para a F3000. Patrocinado por Xandy Negrão, Da Matta escolhe a equipe Pacific, que tinha acabado de desistir da F1. Foi um ano complicado, pois Cristiano não conhecida a maioria das pistas e o seu time ainda não tinha se recuperado totalmente dos problemas que tinha enfrentado nos tempos de F1. Cristiano largava constantemente entre os dez primeiros, mas dificilmente completava as corridas e seu melhor resultado seria um quarto lugar nas ruas de Pau.

Cansado de militar na Europa, Cristiano vê outra possibilidade no outro lado do Atlântico. A F-Indy estava no seu auge e trazia consigo a Indy Lights. Seus antigos rivais Hélio Castroneves e Tony Kanaan já estavam na categoria e base e em 1997 Da Matta resolve percorrer o mesmo caminho. O sonho de chegar a F1 estava adiado. Por enquanto. Correndo pela equipe Brian Stewart, Da Matta teria como maiores adversários justamente Castro-Neves (ainda se escrevia assim...) e Kanaan. Como se voltasse aos bons tempos, Cristiano vence logo em sua terceira corrida de estréia, no oval de Nazareth, surpreendendo a todos. Porém, a equipe Marlboro Tasman de Kanaan (que seria o campeão) e Castroneves dominou o ano e Cristiano teve que se conformar com a terceira posição e o conceituado título de Rookie of the year, com mais duas vitórias em Vancouver e Laguna Seca.

Em sua segunda temporada na Indy Lights, Cristiano se torna um dos favoritos do ano e agora correndo pela poderosa Tasman, o resultado foi um domínio poucas vezes visto na categoria. Da Matta pegou a ponta do campeonato com uma vitória em Long Beach para nunca mais largá-la e com oito pódios e mais três vitórias de ponta a ponta (Nazareth, Trois-Rivieres e Vancouver), Da Matta conquistou o campeonato com duas provas de antecedência! Foi um ano impressionante e o caminho natural de Cristiano era a CART, que estava mais forte do que nunca. Porém, nenhuma equipe de ponta se interessou em Cristiano e o mineiro teve que ir para a pequena Arciero-Wells, que corria com os fracos motores Toyota, mas essa associação com a marca japonesa traria dividendos mais tarde para Da Matta.

Primeiramente, Cristiano procurava se tornar o Rookie of the year de 1999, mas o brasileiro encontrou pela frente o alucinado Juan Pablo Montoya e o colombiano não apenas foi o novato do ano, como conquistou o título! Correndo numa equipe pequena, Da Matta teve que se acostumar, pela primeira vez na vida, a largar no pelotão de trás e mesmo tendo como companheiro de equipe o experiente Scott Pruett, Cristiano pouco pôde fazer, a não ser conseguir um surpreendente quarto lugar em Nazareth, uma pista que já provava ser especial para ele. No entanto, graças a Montoya, Da Matta pôde dar o pulo do gato e se tornar protagonista no automobilismo americano. A Toyota procurava derrotar a Honda, que a anos dominava a F-Indy e para isso ofereceu uma montanha de dinheiro para a Chip Ganassi usar seus motores no ano 2000. Para não fazer feio, a Toyota investiu muito no seu motor e ao longo do ano os japoneses se igualaram a Honda, trazendo consigo Cristiano. Ainda pela equipe Arciero e tendo como companheiro de equipe o espanhol Oriol Servia, Da Matta fez um ótimo campeonato, levando a pequena equipe a posições até então impossíveis. Sempre andando na frente, Cristiano conseguiu uma emocionante primeira vitória em Chicago e conseguiu ficar entre os cinco primeiros oito vezes, terminando o ano em décimo lugar.

Não restavam dúvidas de que Cristiano da Matta era um dos melhores pilotos do momento e quando Michael Andretti saiu da Newman-Hass no final do ano 2000, Kiki foi o escolhido para o substituir. Naquele momento, o Brasil vivia um momento mágico na categoria, com o campeão Gil de Ferran tendo ao seu lado Hélio Castroneves na Penske, a tradicional Newman-Hass tendo, além de Da Matta, Christian Fittipaldi e a Chip Ganassi trazendo da Europa Bruno Junqueira, que acabava de ser campeão da F3000. Era um momento único do automobilismo brasileiro! Assim como tinha sido em toda a sua carreira, Cristiano mostrou serviço logo de cara ao vencer sua primeira corrida pela Newman-Hass em Monterrey, calando a boca da Texaco, que quase quebrou o contrato com a Newman-Hass quando soube da contratação de Cristiano. Contudo, o campeonato foi extremamente disputado e após liderar por algumas provas, Da Matta foi caindo de produção e não chegou a brigar pelo título. No final do ano, Cristiano venceu as duas últimas corridas do ano em Surfers Paradise e Fontana, terminando o campeonato num bom quinto lugar. Por sinal, Da Matta declararia que a vitória em Fontana foi a mais emocionante de sua carreira, após uma forte briga com o italiano Max Papis nos momentos finais.

No entando, nos bastidores, a CART passava por uma forte crise e o belo campeonato de 2001 seria a última temporada realmente forte da categoria. No final de 2001 a Penske anunciou que estava se mudando para a IRL e quando as equipes se preparavam para a temporada 2002, apenas 20 carros estavam inscritos. E cairia para 18 durante o ano... Com a saída da Penske, a Newman-Hass e a Chip-Ganassi se tornavam as favoritas para aquele campeonato. Christian Fittipaldi já pensava em se mudar para a Nascar e Da Matta tomou as rédeas da equipe. Logo na primeira corrida, Cristiano venceu com enorme facilidade, iniciando um domínio poucas vezes visto na categoria. Foram sete vitórias e o título conquistado com enorme antecipação. Desde Alessando Zanardi que a CART não via tamanho domínio e assim como aconteceu com o italiano, a F1 ficou de olho em Cristiano da Matta. A Toyota tinha estreado em 2002 na F1 como o maior orçamento da categoria, mas com dois pilotos medianos no volante. Com um ano de experiência, a Toyota precisava de dois pilotos fortes para a segunda temporada. Primeiramente trouxe o experiente Olivier Panis da BAR. Graças aos anos prestados pela Toyota, Da Matta foi contratado para 2003. Infelizmente, Da Matta entrou para a história como o último campeão da CART, pois no final de 2002 a categoria mudou de mãos e continuou sua longa agonia.

Cristiano da Matta entrou na F1 como indicação clara da parte japonesa da equipe, indicando um dos grandes empecilhos da Toyota até o momento. A parte européia da equipe queria um piloto que tenha, ao menos, corrido na Europa e as partes entraram em conflito. Em 2003 várias regras novas entraram em vigor, como a única volta lançada na Classificação e Cristiano logo se entendeu tanto com o carro como com o regulamento. Após errar feio em sua estréia na Austrália, Da Matta começava a conquistar resultados importante e marcou seus primeiros pontos com um sexto lugar no Grande Prêmio da Espanha, dando um sufoco na poderosa Williams-BMW de Ralf Schumacher no final. Em Silverstone, pista que conhecia dos tempos da F3 Inglesa, Da Matta conseguiu seu primeiro grande feito na F1 ao liderar a corrida graças a uma estratégia diferente, marcando pontos novamente. Foi essa corrida em que o Padre irlandês fez sua primeira aparição pública... Com mais alguns pontos, Da Matta terminava o campeonato na frente de Panis e conquistava o prêmio de Novato do Ano da revista F1 Racing.

Da Matta partia para o seu segundo ano na F1 de forma esperançosa e a contratação de Mike Gascoyne por parte da Toyota era uma certeza de uma ótima temporada. Mas acabou sendo um grande pesadelo! O carro deu um enorme passo para trás e Cristiano começava a se desentender com Gascoyne, que na época tinha a fama de ser a estrela da Toyota. Mesmo após uma boa exibição em Monte Carlo, onde conquistou seus últimos pontos na F1, Da Matta rescindiu seu contrato com a Toyota após o Grande Prêmio da Alemanha. Foi uma enorme decepção e numa entrevista, Cristiano diria que se arrependeu de ter ido para a F1.

Tendo que recomeçar a carreira, Da Matta voltou aos Estados Unidos para correr na Champ Car em 2005, na época uma pálida sombra da forte CART que Cristiano tinha deixado dois anos antes. Correndo na equipe PKV do seu amigo Jimmy Vasser, Da Matta não foi um protagonista naquele ano dominado por Sebastien Bourdais, mas conquistou sua última vitória na categoria em Portland, graças a uma estratégia diferente dos líderes. Já pensando na sua vida pós-automobilismo, Da Matta fez um teste na Stock Car brasileira no final de 2005, mas preferiu ficar mais um ano na Champ Car em 2006, agora na pequena equipe Dale Coyne. Após bons resultados durante o ano, Kiki se mudou para a forte equipe RuSport. No dia 3 de agosto de 2006, durante testes em Elkhard Lake, sua pista preferida, Cristiano sofreu o seu pior acidente na carreira. Numa curva cega, Cristiano atingiu um cervo e o animal atingiu em cheio sua cabeça. Da Matta foi levado imediatamente ao Theda Clark Medical Center em Neenah, Wisconsin, em estado grave, onde foi feita a cirurgia que retirou um pedaço do crânio para aliviar a pressão. Foi ainda induzido ao coma. Toda a comunidade automobilística ficou apreensiva, inclusive na Toyota, que fez uma oração envolvendo várias personagens da F1 na época em prol de Cristiano. Numa recuperação lenta e emocionante, Da Matta sobreviveu e hoje está 100% fisicamente.

Cristiano mantém sua forma discreta de ser, pouco aparecendo na mídia e participando de trilhas de mountain-bike. Porém, sua maior paixão não tinha sido esquecida e ainda nesse ano fez seu retorno às pistas na Gram-Am, já que os médicos o aconselharam a não correr mais em monopostos. Da Matta vive feliz em Belo Horizonte e mesmo não ter tido o sucesso que merecia na F1, o acho o melhor piloto que a Toyota contratou, mas graças a política reinante na equipe, os japoneses deixaram o talento de Da Matta ir embora. Apesar da simplicidade e a timidez, Cristiano tem opiniões fortes. Quando todos pensavam que ele iria para a IRL em 2002, ele disse que "não queria correr em pistas como o Texas". Conta a lenda que numa discurssão com Mike Gascoyne, Da Matta teria dito que "podem me demitir. Vocês me trouxeram dos Estados Unidos para correr nessa carroça?". Kiki, como é chamado carinhosamente, foi um dos grandes pilotos dessa década e marcou uma era do automobilismo brasileiro.

Parabéns!
Cristiano da Matta

Um comentário:

Arthur Simões disse...

Faz aniversário no mesmo dia que eu,mas eu já gostava dele antes.
Ótimo piloto lembro muito bem daquele GP da Inglaterra.
Será que não tinha outra vaga para ele na F1,só que em outra equipe?Era melhor que muitos que corriam naquela época.