Poucos pilotos americanos se aventuravam no outro lado do Atlântico atrás das famosas corridas de Grande Prêmio, mas uma talentosa leva de pilotos ianques fizeram história em provas de sport-cars e fizeram que vários deles entrassem para a história do automobilismo. Entre eles, está Richie Ginther. Este californiano baixinho e cheio de sardas se caracterizou pela tenacidade e, principalmente, pelo vasto conhecimento em mecânica, fazendo com que fosse contratado por várias equipes para desenvolver seus carros e conseguindo até alguns títulos, graças a sua providencial ajuda, tanto como um ótimo escudeiro, como também testando os carros. Raramente lembrado como um grande piloto, talvez por ter feito poucas corridas na F1, Ginther foi uma das estrelas dos anos 60 e se estivesse vivo, estaria completando 80 anos hoje e por isso vamos contar um pouco da história deste californiano.
Paul Richard Ginther nasceu em 5 de agosto de 1930 na cidade de Granada Hills, nas proximidades de Los Angeles, Califórnia. De origem humilde, Ginther sempre gostou de mecânica, até porque o seu pai trabalhava como mecânico na Douglas Aircraft, na época, uma das maiores fabricantes de aviões, tanto militares como de passageiros. Durante a adolescência, Richie, como sempre foi chamado, conheceu uma pessoa que marcaria para sempre sua vida: Phil Hill. Vindo da Flórida, Hill tinha se mudado para a Califórnia e trouxe todo seu amor por carros e Ginther passou a trabalhar com Phil desmontando seus vários carros, pois Hill tinha muitas condições na época. Após terminar o segundo grau, Ginther foi trabalhar na mesma empresa do pai, mas Richie ainda ajudava Hill em suas primeiras corridas como mecânico no seu tempo livre e não demorou a ter oportunidade de fazer uma corrida, em 1951, em Pebble Beach.
Porém, Ginther foi convocado pela Força Aérea Americana a se engajar na Guerra da Coréia e como não poderia deixar de ser, Richie se tornou mecânico de aviões, onde aumentou ainda mais seu conhecimento em mecânica fazendo a manutenção dos caças P-51 e bombardeios B-17. Após dois anos no Oriente, Ginther voltou à Califórnia e recebeu um pedido do seu amigo Hill. Enquanto consertava aviões na Coréia, Phil Hill já fazia seu nome nas pistas californianas e queria dar mais um passo na carreira e decidira participar da famosa Corrida Panamericana, de carros esporte. Como era uma prova extremamente longa, os pilotos precisavam levar consigo um mecânico para ajudar nas emergências e ser uma espécie de navegador. Ginther aceitou no ato ser mecânico de Hill nessa aventura e eles partiram com sua Ferrari para a edição de 1953. De forma surpreendente, eles eram os primeiros colocados quando Hill perdeu o controle do seu carro e bateram forte. Hill ficou traumatizado e praticamente não correu mais naquele ano, mas na edição seguinte eles estariam de volta e mostraram todo o seu potencial ao ficarem em segundo lugar, logo atrás de Umberto Magioli, que tinha em mãos uma Ferrari de fábrica. Esse resultado mudou a vida de Hill, que logo depois seria contratado pela montadora italiana.
Claro que isso marcou a vida de Ginther também, pois ele começou a participar de corridas sozinho, sem a sombra do amigo Hill e ainda em 1954 ele disputou várias provas com um Austin preparado por ele mesmo, conseguindo vários bons resultados. Naquela época, os circuitos americanos receberam várias feras que acabariam entrando na história do automobilismo mundial, como Dan Gurney, Carroll Shelby, Marsten Gregory, além, é claro de Ginther e Phil Hill. Os bons resultados de Ginther chamaram a atenção de John von Neumann, grande revendedor de carros VW e Porsche, e a partir de 1955 Ginther correria pela primeira vez como profissional, correndo com Porsches nas pistas americanas. Em 1956, von Neumann começa a vender carros da Ferrari e Ginther passa a correr com os carros italianos e o sucesso é imediato, com Richie sendo um dos principais pilotos de sport-cars nos Estados Unidos. Porém, o maior vendedor de Ferraris nos Estados Unidos era outra pessoa. Luigi Chinetti era amigo particular de Enzo Ferrari e era o vendedor 'oficial' de Ferraris na América do Norte, mas o italiano, que participou de corridas quando era jovem, resolveu iniciar uma equipe de sport-cars utilizando somente Ferraris. A equipe NART entrou para a história do automobilismo mundial e americano.
Sendo um dos principais pilotos a ter sucesso com Ferraris nos Estados Unidos na época, Ginther foi contratado por Chinetti em 1957 e o sucesso foi imediato, com o americano também fazendo suas primeiras corridas internacionais. Chinetti tinha uma grande influência sobre Enzo Ferrari e por isso Ginther começa a correr pela equipe oficial da Ferrari em determinados eventos, culminando com um segundo lugar nos 1000 km de Buenos Aires, em parceria com Wolfgang von Trips. Além de ser um piloto rápido, Richie começava a se destacar também como um ótimo acertador de carros e a Ferrari se interessa em colocar o americano nos carros de F1. A confiança de Ferrari nos conhecimentos técnicos e no feed-back do americano fica claro quando ele é convidado a fazer parte do time de F1 durante o Grande Prêmio de Mônaco de 1960 com um carro experimental e Ginther consegue um ótimo sexto lugar, estreando na F1 marcando logo seu primeiro ponto. Esse bom resultado faz com que Ginther fosse convidado para outras corridas, como em Zandvoort e no esvaziado Grande Prêmio da Itália, em Monza. Por causa de um boicote das equipes inglesas pela mudança de regulamento em 1961, onde a Ferrari era claramente favorecida, poucos carros largariam para a corrida italiana e Richie Ginther se aproveitou para fazer seu nome. Largando em segundo, Ginther tomou a ponta da corrida e liderou as primeiras voltas, até ser ultrapassado pelo seu amigo Phil Hill, que acabaria vencendo pela primeira vez na F1, mas o 2º lugar de Richie Ginther acabaria lhe rendendo dividendos. Ele seria contratado para fazer parte da equipe Ferrari de F1 em 1961.
Neste ano, a Ferrari correria com um dos seus carros mais belos e conhecidos da história: o modelo 156 'Nariz de tubarão'. As equipes inglesas tinham razão em reclamar de um suposto favorecimento a Ferrari, pois o time italiano tinha um grande conhecimento dos motores 1,5l, que seriam usados a partir daquele ano, e dominou de forma acachapante aquela temporada. Porém, a equipe italiana seria derrotada logo na primeira corrida. Em Mônaco, a Ferrari derrotada pela Lotus de Stirling Moss e Ginther largaria ao seu lado. Foi uma verdadeira briga de gato e rato, com Ginther tentando passar Moss e não conseguindo, mesmo com um carro melhor. Moss chegou em primeiro e Ginther foi um dos primeiros a reclamar das dificuldades de se ultrapassar em Monte Carlo. Porém, Stirling Moss era uma estrela de primeira grandeza da F1 e Ginther, em sua quinta corrida de F1, o acompanhara de perto, fazendo com que o americano se tornasse um dos favoritos ao título. Porém, desde os seus primórdios, a Ferrari sempre foi um time político e ainda no início do ano definira que seus primeiros pilotos seriam Phil Hill e Wolfgang von Trips, com Richie Ginther sendo um obscuro piloto número 3. O segundo lugar em Mônaco acabou sendo o melhor resultado do americano em 1961, onde viu de perto a encarniçada briga entre Hill e Von Trips pelo título, com a taça ficando com o compatriota na penúltima etapa do ano, após a morte de Von Trips em Monza, no que seria a maior tragédia da história da F1, pois o carro do alemão acabaria matando outras quinze pessoas. Ginther conseguiria outros bons resultados, terminando sua primeira temporada na F1 em quinto lugar, mas o americano não fica satisfeito com sua situação dentro da equipe italiana e se muda para a BRM em 1962.
O time inglês já tinha ouvido falar a respeito do vasto conhecimento técnico de Ginther e por isso o contratara, para ajudar a desenvolver o carro e por isso, as primeiras corridas do americano na BRM são de quebras, pois muitas vezes experimentava coisas novas no seu carro. Porém, quando conseguiu completar sua primeira corrida, na França, consegue logo de cara um pódio, mostrando o seu potencial e do carro, mas Graham Hill, seu companheiro de equipe, era quem brigava pelo título e o inglês acabaria derrotando Jim Clark no final do ano, enquanto Richie só marcaria pontos outra vez com um segundo lugar em Monza. Sabendo que Graham Hill era mais veloz do que ele, Ginther passa a utilizar a regularidade para completar o máximo de corridas possíveis e marca mais pontos do que Hill em 1963, perdendo o vice-campeonato por que o americano teve que descartar seus dois piores resultados. Num campeonato dominado pela Lotus de Clark, ter marcado vários pontos foi uma vitória e o terceiro lugar no Mundial de 1963 acabaria sendo o melhor resultado na carreira de Ginther na F1. Em 1964, ainda na BRM e na sombra de Graham Hill, Ginther tenta a mesma tática, mas não consegue um único pódio e termina o campeonato apenas em quinto, enquanto Hill briga pelo título até a corrida final, quando foi jogado para fora pela Ferrari de Lorenzo Bandini, numa ordem de equipe para lá de radical!
Ainda com a reputação como ótimo acertador de carros intacta, Richie Ginther recebe um convite para ser piloto principal da Honda em 1965. A equipe japonesa havia estreado no ano anterior com o piloto americano Ronnie Bucknum, mas a inexperiência do piloto fazia com que o time nipônica necessitasse de um piloto que pudesse desenvolver o carro. E pela primeira vez na carreira, Richie teria o status de primeiro piloto de uma equipe. Porém, como é de se imaginar, os primeiros resultados não foram nada satisfatórios, com várias quebras mecânicas, mesmo com o americano conseguindo ótimos resultados nos treinos, onde largava sempre entre o top-5. Porém, no Grande Prêmio do México, Ginther se pula à frente após uma boa largada e após liderar a corrida de ponta a ponta, mesmo com seu compatriota Dan Gurney sempre por perto, Richie Ginther consegue sua primeira vitória na F1. Aquela seria também a primeira vitória na história da Honda e da Goodyear, iniciando uma incrível série de vitórias na F1 para as duas gigantes. Porém, aquela seria a primeira e única vitória de Ginther. A Honda não começa bem o ano de 1966 e Richie participa de poucas corridas e abandona o time japonês no final do ano, terminando sua carreira na F1. Foram 52 corridas, uma vitória, três melhores voltas, 14 pódios, 107 pontos conquistados e o terceiro lugar em 1963 como melhor resultado.
Em 1967, Ginther se junta a Dan Gurney no projeto do carro Eagle, o primeiro carro americano a ter um relativo sucesso na F1 e Ginther ainda participa dos treinos para o Grande Prêmio de Mônaco daquele ano, mas não se classifica e ainda assiste a triste morte de Lorenzo Bandini, queimado após uma batida. A Eagle também participava das 500 Milhas de Indianápolis e Ginther é inscrito para correr na famosa corrida americana, mas um acidente nos treinos, onde acabou se queimando, faz com que Richie se aposentasse definitivamente das corridas com apenas 36 anos de idade. O americano já tinha visto muitas mortes de perto e ter visto alguns colegas serem calcinados por chamas fizeram tomar essa atitude repentina. Logo, Richie se torna chefe de equipe na Can-Am, com um Porsche, conseguindo andar próximo das McLarens no final dos anos 60 e início dos 70. Após se afastar do automobilismo, Ginther se mudou para o México, mas sempre que podia, participava corridas comemorativas. Em 1989, Richie foi a Donington Park participar do 40º aniversário da BRM e deu algumas voltas no seu antigo carro, mas todos viam que Ginther não estava bem. Ele estava com problemas cardíacos e por isso não completou muitas voltas, mas como estava na Europa, resolveu ficar mais alguns dias na França com sua família. No dia 20 de setembro de 1989, Richie Ginther tem um infarto e morre aos 59 anos de idade. Ao contrários dos seus vários amigos que conquistou ao longo dos anos, Ginther morreu ao lado da família, mas ainda com a chance de matar a saudade dos carros que guiou tão bem nos seus áureos tempos de piloto de F1.
Um comentário:
Tai um que eu nunca tinha ouvido falar...
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