quarta-feira, 18 de abril de 2012

El Matador


Mesmo tendo conquistado ‘apenas’ dois títulos mundiais, ele sempre foi e será considerado um dos maiores pilotos de rally de todos os tempos. Mais do que isso. Carlos Sainz foi uma espécie de bandeira do WRC em seus dezoito anos de carreira, sendo contemporâneo de outras lendas do esporte e com elas elevaram a popularidade do Mundial de Rally ao nível de hoje, além de Carlos ter tornado o rally um esporte bastante popular na Espanha, onde ganhou o seu apelido pela frieza com que dava o bote nos adversários, assim como os toureiros de sua Madri. Dono de muitas glórias nos mais diversos carros e agora preparando seu filho para seguir sua carreira (só que no asfalto), Carlos Sainz acabou de completar cinqüenta anos e por isso vamos conhecer um pouco mais de sua longa e prodigiosa carreira.

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Carlos Sainz Cenamor nasceu no dia 12 de abril de 1962 em Madri, sendo o caçula de quatro irmãos. O esporte sempre esteve presente na vida de Carlos desde pequeno, quando aos sete anos recebeu suas primeiras aulas de esqui e tênis. Porém, sua grande paixão era o futebol e o Real Madri, chegando a fazer parte das canteiras do clube espanhol e, já famoso, tentar a presidência madridista, não o conseguindo. Aos 16 anos de idade, Carlos se sagrou campeão espanhol de squash depois de dois vice-campeonatos, mas foi nessa idade que Sainz conheceu a velocidade pela primeira vez. Seu avô lhe comprou uma moto e adulterando sua idade, participou de uma corrida de MotoCross. Carlos tinha o grande incentivo de sua família, em particular do seu irmão mais velho Antonio e assim ele se iniciou nos rallys em 1980, à bordo de um Renault 5. Fazendo a faculdade de direito e trabalhando no setor de marketing numa rede hoteleira, Carlos Sainz utilizava seu dinheiro na preparação do seu pequeno carro e logo em seu segundo rally, já em 1981, Carlos conseguiu um quinto lugar sem erros, chamando a atenção dos críticos na época. Contudo, Sainz nesse mesmo ano se interessa pelas corridas no asfalto e utiliza seu Renault 5 para o recém-iniciado campeonato monomarca, onde consegue bons resultados. No ano seguinte, Sainz vence cinco das sete corridas do campeonato e seu bom desempenho faz com que ele seja o representante espanhol no Festival de Formula Ford, onde ele chegou até as quartas de final. Em 1984 Sainz participaria do Campeonato Espanhol de Turismo e do Campeonato Inglês de F-Ford, tendo resultados distintos, pois com um Ford Escort XR3, Sainz conseguiu alguns pódios no certame nacional, mas resultados modestos no certame inglês, mas essa seria sua primeira experiência internacional no automobilismo. E o rápido fim de sua carreira no asfalto.

Paralelo a sua pequena aventura nas pistas, Carlos Sainz participava com sucesso de rallys espanhóis e em 1985 ele se torna piloto oficial da Renault no Campeonato Espanhol de rally, além de algumas participações no Campeonato Europeu. Sainz perderia o título nacional para o Peugeot de Bruno Saby e foi nesses tempos que Carlos ganhou a reputação de grande acertador de carros e perfeccionista no modo de preparar seu carro para o rally. Após um ano cheio de abandonos em 1986, Sainz se muda para a Ford em 1987, primeiro ano dos carros Grupo A. O contrato com a montadora americana não apenas lhe garantia o bom Ford Sierra Cosworth, como também algumas participações do Mundial de Rally, onde Sainz faz sua estréia no Rally de Portugal. Carlos se destaca ao chegar a ficar em terceiro lugar num certo momento, mas um turbo quebrado pôs tudo a perder, mas o espanhol tinha dado seu recado. Depois de quatro vitórias, Carlos Sainz se sagra campeão espanhol pela primeira vez, mas com a aposentadoria do navegador Antonio Boto no final desse ano, Sainz teria que procurar um novo companheiro. Depois de vários testes com vários navegadores, Sainz acabaria assinando com Luís Moya, que seria seu navegador por vários anos e com ele conquistaria seus melhores resultados. Para 1988, Carlos Sainz continuava como piloto da Ford e se sagraria bicampeão espanhol com apenas duas vitórias, mas suas atuações no Mundial de Rally, cada vez melhores, chamam a atenção dos principais dirigentes da categoria. O espanhol andava no mesmo nível do principal piloto da Ford no Mundial, Didier Auriol e no Rally de San Remo Sainz liderou os dois primeiros dias, sendo chamado de ‘olhos de gato’ pela imprensa italiana por causa de sua tocada fortíssima nas famosas etapas noturnas do rally italiano. Porém, Sainz terminou a prova apenas em quinto, mas foi o suficiente para receber a ligação de Marion Bell, esposa de Ove Andersson, o chefe de competições da Toyota Team Europe, braço dos rallys da marca japonesa, sediada na Alemanha. A marca japonesa tentava conquistar seu primeiro título no Mundial e acabar com o domínio da Lancia. Sainz teria como companheiro de equipe o finlandês Juha Kankkunen, que a princípio seria o primeiro piloto da equipe. Com o carro em desenvolvimento, os dois pilotos ainda sofreriam de muitos problemas de confiabilidade, o que faria Sainz abandonar as quatro primeiras etapas do ano, mas Kankkunen vence pela primeira vez com o modelo Celica na Austrália e Sainz termina o ano em alta, conseguindo três pódios consecutivos nas três últimas etapas do ano, finalizando o campeonato em oitavo.

Para 1990, Juha Kankkunen resolve deixar o projeto da Toyota e se transferir para a Lancia, que vinha vencendo todos os títulos mundiais desde 1987. Logo em sua segunda temporada completa do Mundial, Carlos Sainz seria alçado a primeiro piloto da equipe Toyota e os japoneses não se arrependeriam. Com o novo Celica GT-4, Sainz fez um campeonato perfeito, conquistando pontos importantes nas primeiras etapas, para finalmente conseguir sua primeira vitória no Mundial no famoso Rally Acrópole, etapa grega do campeonato. Porém, foi na oitava etapa do campeonato que Sainz ganhou a confiança necessária para se tornar campeão e o respeito do seus adversários. A etapa finlandesa do Mundial sempre fora dominado pelos pilotos nórdicos, mesmo o rally acontecendo na terra, ao contrário do rally sueco, realizado sobre neve. Porém, o afamado Rally dos Mil Lagos tinha por característica os vários saltos que faz desta etapa muito especial e peculiar, com os pilotos locais obtendo muito sucesso. Pois em 1990 Carlos Sainz acabou com esse tabu e foi o primeiro piloto não-nórdico a vencer na Finlândia. Mesmo Didier Auriol vencendo a antepenúltima etapa, Carlos Sainz garantiu seu primeiro título mundial e ainda conseguiu seu quarto triunfo na Inglaterra, etapa derradeira do campeonato. Evidentemente Carlos Sainz iniciou a temporada de 1991 como favorito destacado e três vitórias nas cinco primeiras etapas do ano acentuaram essa sensação, mas Juha Kankkunen utilizou sua velha magia e mais adaptado ao Lancia Delta Integrale, foi um adversário duro a Sainz. Os dois polarizaram o campeonato e o espanhol da Toyota chegou à última etapa como líder do campeonato com apenas um ponto de vantagem sobre Kankkunen. Tudo seria decidido no famoso Rally do RAC, a etapa britânica do campeonato, e o finlandês assegurou com sua quinta vitória no ano seu terceiro título mundial. Sainz ficou apenas sete pontos atrás de Kankkunen e suas cinco vitórias fizeram com que se juntasse ao finlandês como novo recordista de vitória numa mesma temporada.

Como havia acontecido nos últimos anos, Sainz teria como maiores rivais os dois pilotos da equipe Martini Lancia, Kankkunen e Didier Auriol. O francês tinha um estilo extremamente agressivo e conseguiu seis vitórias durante a temporada, mas junto aos 120 pontos pelas vitórias, que lhe garantiu o recorde de triunfos numa mesma temporada, Auriol só marcou mais um pontinho, mostrando uma inconsistência que acabaria sendo fatal em suas pretensões de título. Sainz e Kakkunen foram bem mais regulares e com a vitória na penúltima etapa do ano, o espanhol liderava o campeonato com apenas dois pontos de vantagem sobre Kankkunen e três sobre Auriol. Com outra vitória na Inglaterra, Carlos Sainz conquistava seu segundo título mundial e se eternizava como um dos grandes do WRC. A Toyota fez uma edição especial do Celica em homenagem a Sainz, mas o espanhol acabou deixando a equipe em 1993 e mesmo ficando com o Lancia que havia feito tanto sucesso, o carro italiano dava claros sinais de envelhecimento frente aos novos Ford Escort, Subaru Impreza e Mitsubishi Lancer, fora que Sainz teve que se conformar com uma equipe particular, pois os italianos haviam abandonado oficialmente o WRC no final de 1992. Como resultado, Carlos Sainz esteve longe de defender seu título e ficou com sua pior posição deste que se tornou piloto full-time do Mundial de Rally: oitavo lugar. Contudo, não demorou muito para que o feeling técnico de Sainz chamasse a atenção de uma equipe de fábrica e o espanhol foi chamado pela Subaru em 1994. Os japoneses tinham como chefe de equipe David Richards, antigo navegador de Ari Vatanen, a quem o inglês contratou inicialmente para desenvolver o modelo Impreza. Junto com Vatanen, a Subaru tinha sobre sua asa o jovem e impetuoso Colin McRae e juntamente com Sainz, transformaram os carros azuis em favoritos ao título de 1994. Seria o início da lenda dos famosos carros azuis com patrocínio amarelo da 555.
Sainz liderou a Subaru na sua primeira luta pelo título contra a Toyota de Didier Auriol, com o francês levando a vantagem com uma vitória na penúltima etapa do ano. Este seria o único título de Auriol. Porém, ficava claro que a Subaru tinha o melhor carro do plantel e em 1995 Sainz era franco favorito ao título, mas o espanhol não contava com o crescimento exponencial de Colin McRae e os dois companheiros de equipe dominaram o campeonato, criando alguns atritos entre eles, como na vitória de Sainz na Espanha, quando a Subaru pediu a McRae que cedesse o triunfo ao piloto local. Os dois chegaram empatados na última etapa do ano, no País de Gales, casa de McRae. Foi uma etapa histórica, onde Colin McRae derrotou Sainz por apenas 36s e se tornou o mais jovem piloto a se tornar Campeão Mundial até então. Com a desclassificação da Toyota, poucos se deram conta do quinto lugar conquistado por Tommi Makkinen, segundo piloto da equipe oficial da Mitsubishi. Pois a partir de 1996, Makkinen se tornou o piloto dominante no resto da década de 90, conquistando um inédito tetracampeonato consecutivo no Mundial de Rally a partir de então. Sem clima na Subaru, Carlos Sainz se transferiu para a Ford e se tornaria, junto com Colin McRae, nos maiores rivais de Makkinen em temporadas empolgantes e que tornaram o Mundial de Rally um dos esportes a motor mais populares do mundo. No final de 1997, a Toyota ainda tentava se reerguer do vexame de 1995, quando foi desclassificado do Mundial de Rally por irregularidades técnicas. Com um novo carro, o Corolla WRC, os japoneses novamente investiram em Sainz e o espanhol não decepcionou, fazendo o carro competitivo quase que imediatamente e brigando cabeça a cabeça com Tommi Makkinen pelo título da temporada de 1998. Na última etapa do ano, no Rally do RAC, Makkinen sofre um pequeno acidente e teve que abandonar, deixando Sainz necessitando apenas de um quarto lugar para se sagrar tricampeão mundial. Então, aconteceu uma das cenas mais impressionantes e cruéis da história do automobilismo mundial. Carlos Sainz apenas administrava nos estágios finais e estava conseguindo o seu objetivo, quando, na última especial, faltando 500 metros para o fim, o Corolla perdeu velocidade e foi parando. Ninguém acreditava no que estavam vendo. O motor japonês abriu o bico e Carlos Sainz estava atônito, enquanto Luis Moya chutava e esculhambava o carro que lhe tiraram um título certo tão perto do final.

Por incrível que pareça, Carlos Sainz passou a ser ainda mais respeitado pela sua atitude serena frente a um acontecimento tão frustrante. Ele foi até Makkinen, que só assistia ao rally e o parabenizou. Carlos permaneceu mais um ano na Toyota, mas com os japoneses utilizando parte de sua equipe de rally na empreitada da F1, que os fariam entrar na categoria a partir de 2002, fez Sainz mudar de equipe novamente em 2000, indo para a Ford ser companheiro de equipe de McRae pela segunda vez. E novamente houve atritos, com os dois tirando pontos um do outro e fazendo com que Marcus Grönholm, da Peugeot, conquistasse seu primeiro título de pilotos, enquanto a Ford conquistava o Mundial de Construtores. Num dos campeonatos mais disputados da história, Sainz terminou o campeonato de 2001 apenas em sexto lugar, só que ínfimos onze pontos atrás do campeão Richard Burns, da Subaru. Após um ano apagado em 2002 com a Ford, Carlos Sainz se transferiu para a Citröen em 2003, trazendo consigo Colin McRae. Teoricamente eles seriam os pilotos principais da montadora francesa, mas havia um tal de Sebastien Loeb no caminho, iniciando sua carreira de glórias naquele momento. Ninguém esperava que o francês, que até então era conhecido por seu desempenho apenas no asfalto, superasse duas lendas vivas do WRC, mas foi justamente isso o que aconteceu. Sainz ainda lutou pelo título graças a nova pontuação imposta a FIA, que diminuía a diferença entre os pilotos que pontuavam, mas ninguém poderia negar que era Loeb o primeiro piloto. Para complicar, a FIA restringe as equipes oficiais a terem somente dois pilotos oficiais, quando era normal até quatro pilotos naqueles áureos tempos. Essas mudanças de regras seriam ainda mais venais ao WRC, que perderia montadoras, fãs e popularidade a partir daquele momento. A Citröen tinha que escolher entre Sainz e McRae, acabando por ficar com o espanhol, muito por causa do seu valioso patrocínio da Movistar. Num campeonato dominado por Loeb e por Petter Solberg, da Subaru, Carlos Sainz ainda conseguiu uma última glória. Em 2004 havia uma disputa toda especial para saber quem era o piloto mais vitorioso da história do WRC, que tinha Sainz, Makkinen e McRae. O espanhol estava empatado com McRae e na Argentina ele desempatou a contenda, se tornando o piloto com mais vitórias na história do WRC até então com 26 triunfos. O que ninguém sabia era que aquela seria a última vitória de Sainz no WRC. Com 42 anos de idade, Sainz anunciou que estaria se aposentando no final de 2004 e provando que nunca deixou de ser competitivo, o espanhol findou sua última temporada completa do Mundial de Rally em quarto lugar. Ainda em 2005, Sainz fez algumas etapas do Mundial no lugar do seu substituto na Citröen, o desastrado belga François Duval, dando a oportunidade para que os fãs vissem pela última vez o talento de Carlos Sainz numa etapa válida do Mundial. Sua longa carreira de dezoito anos teve 196 rallys, 26 vitórias, 97 pódios, 757 especiais vencidas, 1242 pontos conquistados e dois títulos mundiais (1990 e 1992).

Mesmo tendo conquistado seus títulos a mais de vinte anos, Carlos Sainz nunca deixou de ser competitivo e foi um piloto vencedor até encerrar sua carreira em 2004, conseguindo sucesso em cinco marcas diferentes (Toyota, Lancia, Ford, Subaru e Citröen) e carros diversos. Essa versatilidade fez com que Sainz obtivesse sucesso em sua nova empreitada: o Rally Dakar. Após uma pequena pausa nos rallys, Sainz se mudou para o mundo off-road com sucesso e contratado pela VW e seu histórico Touareg, ele venceu o principal evento off-road do mundo, o Rally Dakar, em 2009, derrotando seu companheiro de equipe Nasser Al-Attiyah. Com a VW se concentrando agora na sua empreitada no WRC, Carlos Sainz se tornou um dos principais dirigentes da montadora no WRC, inclusive utilizando seu conhecimento técnico para testar o novo carro. Porém, Sainz não está 100% focado nessa sua nova fase como dirigente, pois seu filho, Carlos Sainz Jr, começou há pouco tempo sua caminhada rumo a F1, vencendo o Campeonato Europeu de F-Renault em 2011 e chegando a F3 Inglesa com apoio total da Red Bull. Carlos Sainz ficou marcado para sempre nos seus fãs como uma marca de elegância e frieza na forma como domava seus carros nas curvas cheias de terra, lama ou neve em todo mundo, não importando o carro. Como um toureiro experiente, El Matador domava seus carros e com eles conseguiu todas as suas glórias, sendo admirado até hoje.

Parabéns!
Carlos Sainz 

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