Ele foi um dos homens mais espetaculares e agressivos da
história do rally e dono de uma história de vida que virou livro, cujo título
está aí em cima. Ari Vatanen foi uma das primeiras estrelas do Campeonato Mundial
de Rally da FIA e sua tocada agressiva, normalmente ao lado do navegador David
Richards, entrou para a história e suas câmeras on-board demonstravam um homem
corajoso atrás de vários volantes ao longo dos anos 70 e 80, lhe garantindo um
título mundial e várias conquistas do Paris-Dakar, mas seu talento era muito
maior do que os seus números e sua vontade de viver após um sério acidente não esmoreceu
seu amor pelo esporte, fazendo Vatanen tentar ser até presidente da FIA.
Completando 60 anos hoje, vamos conhecer um pouco mais de sua carreira.
Ari Vatanen Pieti Uolevi nasceu no dia 27 de abril de 1952
na pequena cidade de Tuupovaara, na região rural da Finlândia. Segundo o
próprio Vatanen, a cidade parecia ser a vila do Papai Noel durante 365 dias do
ano, o que significava muita neve e gelo, além de que desde cedo, Vatanen
esteve em contato com superfícies escorregadias, ajudando-o a ter controle
sobre derrapagens com seus carros. Aos 18 anos Ari Vatanen começou a se
interessar nos rallys, esporte bastante popular no seu país e no ano seguinte
comprou um Opel Kadett e fez seus primeiros rallys no campeonato nacional, ao
lado do navegador Martti Simonen, conquistando logo em seu terceiro rally um
segundo lugar, conquistando sua primeira vitória ainda em seu ano de estréia,
no Tott-Porrassalmi Rali. Em 1973 Vatanen passa a usar um Opel Ascona e no ano
seguinte participa pela primeira vez de uma etapa do Campeonato Mundial de
Rally, o Rally dos Mil Lagos, na sua Finlândia. Em 1975 Vatanen inicia sua
participação do Campeonato Inglês de Rally com um Ford Escort RS1800 e se torna
campeão em 1976 e 1980. Naquela época, o certame britânico era tão popular como
o Europeu e isso garantiria um bom carro para Vatanen quando ele fez sua
estréia como piloto regular do Mundial a partir de 1977. Em 1979 Vatanen é
contratado pela Rothmans Rally Team, que nada mais era que o time oficial da
Ford, onde correria ao lado do compatriota Hannu Mikkola e o sueco Björn
Waldegard. Enquanto seus companheiros de equipe brigaram ponto a ponto pelo
título, com vitória de Waldegard por um único ponto, Vatanen ficou em quarto
lugar no campeonato, empatado com o compatriota Markku Allén, tendo um segundo
lugar na Finlândia como melhor resultado.
Nessa sua primeira temporada, após utilizar vários
navegadores diferentes em quase dez anos de carreira, Vatanen tem o inglês David
Richards como seu navegador oficial e seria com ele que obteria seus melhores
resultados. Em 1980 Vatanen consegue sua primeira vitória no Mundial no Rally
Acrópole (etapa grega), mas sua conhecida pilotagem espetacular lhe trazia
muitos fãs, mas também inconsistência, fazendo-o repetir o quarto lugar do ano
anterior, bem distante de brigar pelo título. Porém, Vatanen faz um campeonato
irretocável em 1981 e teria que superar a decadência do seu Ford Escort para
derrotar Guy Fequelin da Talbot e Hannu Mikkola da Audi para se tornar campeão
mundial, com vitórias na Grécia, Finlândia e... Brasil! Para quem não sabe, o
Brasil sediou duas etapas do WRC em 1981 e 1982, mas foram tão desorganizadas,
particularmente o segundo, que o Mundial nunca mais voltou para essas bandas.
Por incrível que pareça, Vatanen não defende seu título em 1982 e participa de
poucos rallys nesse ano e no próximo. Ainda contratado pela Ford, Ari sabia que
não tinha chances contra os Audi Quattro, além de que David Richards havia
deixado seu cargo como navegador e iniciaria sua longa carreira como dirigente.
Vatanen chegou a utilizar sua esposa Rita (e vencendo!) como navegadora, mas em
1984 teria como companheiro de jornadas o inglês Terry Harryman quando ele
recebeu uma boa proposta para voltar ao WRC.
O Audi Quattro foi apenas o primeiro de uma série de carros
que entrariam para a história do Mundial de Rally. Os carros conhecidos como
Grupo B entrariam com força a partir de 1982 com carros leves, com tração nas
quatro rodas e uma potência descomunal. Os rallys se tornavam cada vez mais
velozes e populares. Assim como também perigosos. Capitaneado pelo antigo
navegador Jean Todt, a Peugeot construiu seu carro ‘Grupo B’ a partir de 1984 e
contrata Vatanen para desenvolver o novo carro. A Audi continuava o carro
dominante, mas tinha como rivais a Lancia e a Nissan. A Peugeot sofreu durante
o ano, mas quando Vatanen vence três das quatro últimas provas do campeonato,
isso provava que a montadora francesa viria forte em 1985. Agora tendo
companheiro de equipe Timo Salonen, Vatanen era o favorito ao título de 1985. O
finlandês vence as duas primeiras etapas em Monte Carlo e na Suécia, mas uma
série de erros faz com que ele só conseguisse outro resultado de relevo com um
segundo lugar na Austrália, completando a dobradinha com Salonen. Já nessa
época as velocidades que os carros vinham atingindo chamavam a atenção de todos
e durante o Tour de Corse, o italiano Attilio Bettega morreu instantaneamente
quando sofreu um acidente com seu Lancia. Durante a etapa argentina, Vatanen vinha
numa sessão rápida quando perdeu o controle do seu Peugeot e saiu capotando. O
carro ficou destroçado e o finlandês teve fraturas na coluna, costelas, joelho
e tornozelo, sendo que o joelho teve que ser reconstruído as pressas e ele
mancaria para sempre. Porém, a grande convalescência do maior acidente de Ari
Vatanen foi que o marcou. Era a primeira vez que o finlandês passaria tanto
tempo sem correr e isso afetou seu emocional. Com uma estranha rouquidão no
hospital, Vatanen pensou estar com câncer na faringe, logo descartado pelos
médicos. Durante sua recuperação, Ari se sentia sempre fraco e ele lembrou que
fez três transfusões de sangue no hospital de Córdoba, convencendo-o que ele
havia contraído o vírus da AIDS, o que na época era praticamente uma sentença
de morte. Mesmo tudo negado, Vatanen ficou em depressão, aumentando seu tempo
de recuperação. Porém, durante o tempo em que convalescia, o mundo do WRC
sofria mudanças graves. Quando Henri Toivonen morreu em 1986, seguiu a
conclusão que os carros do Grupo B eram tão velozes, que os pilotos, os
melhores do mundo, não eram rápidos o suficientes para guiá-los e os mesmos
foram proibidos a partir de 1987. A Peugeot não aceita a decisão e abandona a
categoria, se mudando para o rally cross-country.
Jean Todt se lembra novamente de Vatanen e com o finlandês
já recuperado, é chamado para participar do Rally Paris-Dakar em 1987 e logo de
cara, Ari Vatanen vence em sua estréia do famoso Rally da Morte. Vatanen
venceria outras duas vezes, mas foi sua última vitória, em 1989, a mais
marcante. No meio do Rally, com todos os rivais da Peugeot já tendo abandonado,
Todt chamou Vatanen e o outro piloto do time, Jacky Ickx, de lado e disse que o
vencedor do rally seria o ganhador de um cara-e-coroa. Vatanen foi o vencedor
da ‘contenda’, mas Ickx ficou furioso e toda vida era o mais rápido das
especiais, mas parava seu carro no final, esperando Vatanen completar a
especial na frente. O finlandês passou para a Citröen a partir de 1991, onde
ficou vários anos, mas não voltaria a vencer o Rally na África, tendo disputado
seu último rally em 2007, pela VW. Após seu acidente na Argentina, Vatanen
nunca mais participou de um campeonato inteiro do WRC, mas em 1993 ele foi
chamado por seu antigo navegador David Richards, agora chefe da Prodrive, para
desenvolver o novo carro da Subaru, que anos mais tarde entraria para a
história como um dos mais vencedores do WRC. Ari Vatanen participou de etapas espaças
do WRC até 1998, quando completou seu centésimo rally na Grã-Bretanha e mesmo
tendo apenas dez vitórias, é até hoje considerado uma lenda do WRC.
Desde 1993 morando na França, Ari Vatanen entrou para a
política e em 1999 ele foi eleito para o Parlamento Europeu. Em julho de 2009,
Vatanen tentou a presidência da FIA, mas por ironia das ironias, seu
concorrente seria Jean Todt, a quem foi tão ajudado no passado. Durante a
campanha, Vatanen preferiu atacar muito mais Max Mosley do que seu amigo Todt,
mas o francês acabou vencedor, mesmo Vatanen tendo recebido muito apoio das
pessoas cansadas da política de Mosley. Dono de uma tocada super agressiva, Ari
Vatanen ganhou muitos fãs por causa disso e seus vídeos no youtube mostram
muitas cenas de rally onde o navegador, uma pessoa acostumada com aquilo,
soltam vários ‘oh, my god!’ enquanto Vatanen desbrava estradas estreitas e
cheias de abismos. Porém, a filmagem mais conhecida de Ari Vatanen aconteceu em
1988. Utilizando o mesmo Peugeot 205 Turbo, mas com algumas modificações, Ari
Vatanen foi a famosa corrida de subida de montanha em Pikes Peak, onde o finlandês
venceu com direito a recorde, mas o mais importante, lhe rendeu um documentário
emocionante, assim como seu livro lançado no mesmo ano, contando sua história
até ali: Todo Segundo Conta. Seja como político, mas principalmente como grande
piloto de rally ao longe de mais de 25 anos, Ari Vatanen entrou para a história
do automobilismo.
Parabéns!
Ari Vatanen
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