domingo, 8 de junho de 2014

Fica, Montreal!

Certos circuitos deveriam ser eternos no calendário da F1. Interlagos e seu clima instável nos proporcionou corridas históricas. Monte Carlo e seu charme nos emocionou por variados motivos. Assim também é com Suzuka, Silverstone e Monza. São todos circuitos icônicos, que mesmo antiquados para os altos padrões atuais, ainda conservam a alma da F1. Do mesmo jeito que os autódromos supracitados, o circuito Gilles Villeneuve e seu circuito apertado e veloz vez por outra nos proporciona corridas como a de hoje, onde a emoção fez parte de todas as setenta voltas da corrida. Hoje houve surpresas, emoção, ultrapassagens, acidentes e um novo vencedor. Se a parte coxinha da F1 não aparecer e punir Daniel Ricciardo pela ultrapassagem fora dos limites da pista em cima de Sérgio Pérez, a F1 deverá ter conhecido seu vencedor mais feliz em todos os tempos. O australiano já havia conquistado a Red Bull com sua simpatia e agora o faz em todo o paddock. A prova disso foi os gritos de 'Ricciardo' no pódio. E Daniel fez por merecer com uma ultrapassagem belíssima em cima de Nico Rosberg na penúltima volta, conseguindo a primeira vitória da Red Bull em 2014 e acabando com a invencibilidade da Mercedes nesse ano, que ainda viu Lewis Hamilton abandonar novamente.

A primeira volta deu o tom da corrida, com disputas emocionantes em todas as posições e um acidente forte. Lewis Hamilton largou claramente melhor do que Rosberg, mas o alemão usou a prerrogativa de estar por dentro na primeira curva e retardou a freada, garantindo a primeira posição e por consequência, alargar a curva e fazendo com que Lewis saísse da pista, com Vettel assumindo o segundo lugar. Lá atrás, Max Chilton rodava e fazia que Jules Bianchi batesse forte no muro. Duas semanas após o histórico nono lugar de Bianchi, a Marussia amargava um prejuízo com seus dois carros batifod e Chilton tendo sua invencibilidade quebrada ao abandonar pela primeira vez na F1 desde que estrou no ano passado. Um feito e tanto de Chilton, mas relativizado pelo fato do inglês ter chegado quase sempre em último nas 25 corridas do seu recorde. Quando a corrida reiniciou-se, Hamilton não teve problemas em ultrapassar Vettel e começar os ataques em cima de Rosberg, principalmente quando os dois carros da Mercedes colocaram os pneus macios. Então, veio a segunda polêmica do dia. Atacando Rosberg na freada da chicane do muro dos campeões, Lewis fez com que o companheiro de equipe errasse e passasse reto, com Nico permanecendo na ponta e ganhando mais de 1s com a manobra. Sem punições, Hamilton recomeçou o ataque, quando a Mercedes teve seu primeiro problema no ano. E em dupla. Um pouco antes da segunda rodada de paradas, tanto Rosberg como Hamilton tem problemas na unidade de potência dos seus carros. De dominadores, a Mercedes era 2s mais lenta que os demais carros. Porém, Hamilton abandonou logo depois de sua segunda parada devido a problemas de freios, mas a corrida estava longe de terminar.

Numa estratégia diferente e contando com a eficiência dos seus dois pilotos, a Force India estava numa tática de fazer apenas uma parada. Sergio Pérez lembrou seus bons tempos de Sauber ao andar mais da metade da corrida com pneus supermacios, enquanto Hulkenberg segurava os carros da Red Bull. Primeiramente atrasado por Felipe Massa no início da corrida, Daniel Ricciardo inaugurou a primeira rodada de paradas e deixou para trás o finlandês, sendo também beneficiado pela má parada de Massa. Já encostado em Vettel, Ricciardo também parou antes do companheiro de equipe e se beneficiou disso, passando a atacar Pérez, que vinha em segundo e próximo de Rosberg, mas sem muita ação em cima do piloto da Mercedes. Para quem gosta de teorias da conspiração, basta lembrar do GP da Malásia de 2012, quando Pérez, com Sauber e motor Ferrari, vinha mais rápido que a Ferrari de Alonso e após uma mensagem de rádio, saiu da pista de forma estranha e praticamente garantiu a vitória do espanhol. Com motor Mercedes, Pérez não fez nada para atacar Rosberg... Porém o alemão demonstrava o potencial arrasador da Mercedes, pois mesmo com um motor meia boca, andava num ritmo decente. Porém, Pérez começa a sofrer com problemas de freio e quando era mais pressionado por Vettel, Ricciardo fez uma ultrapassagem audaciosa por fora na curva um, chegando a colocar os pneus direitos na grama. Rapidamente o australiano partiu para cima de Rosberg e em duas voltas ultrapassou o problemático Mercedes do alemão para assumir a ponta na penúltima volta da corrida. Mais atrás, a briga continuava forte. Felipe Massa, talvez em sua melhor corrida desde o acidente com a mola em 2009, vinha barbarizando com uma estratégia diferente. Felipe liderava com os dois carros da Mercedes atrás, mas tendo feito sua primeira parada ainda na volta 15, achou por bem fazer uma segunda parada, perdendo a chance de vitória. Massa voltou à pista atrás de Bottas e com muito mais ação, a Williams pediu para que o finlandês cedesse a posição. Desconcentrado com o pedido, Bottas tentou uma manobra banzai em cima de Hulkenberg e acabou tomando o xis e a ultrapassagem de Massa, que, de forma decisiva, ultrapassou Hulkenberg quase que imediatamente e virando a volta mais rápida da corrida, se aproximou de Vettel. Com os problemas de Pérez, Vettel efetuou a ultrapassagem na penúltima volta e sem querer perder muito tempo, Massa tentou a manobra na curva um, mas num erro de cálculo de ambos, Massa e Pérez bateram muito forte, por muito pouco não levando Vettel de roldão, e trouxe o safety-car para a pista, garantindo a vitória de Daniel Ricciardo.

Foi irônico ver a alegria de Christian Horner depois da prova, pois era notório que o chefão da Red Bull queria Kimi Raikkonen para o lugar do aposentado Mark Webber e Ricciardo foi uma imposição do consultor Helmut Marko, com Horner tendo que engolir a seco o jovem australiano. Porém, a temporada começou e Ricciardo vem fazendo uma temporada surpreendente, superando Vettel de forma constante (não sendo o caso nesse final de semana) nas classificações e estando na frente do campeonato. Hoje, Ricciardo, que ganhou o coração da equipe, garantiu a primeira vitória da Red Bull em 2014 e garantiu também a segunda ironia do dia. Até o ano passado havia uma torcida velada contra a Red Bull, que vem massacrando os adversários desde 2010. Porém, quando Ricciardo ultrapassou Nico Rosberg na penúltima volta, houve um urro por parte da torcida e todos pareciam muito felizes pela primeira vitória do simpático australiano que de forma surpreendente lidera a Red Bull como terceiro colocado no Mundial de Pilotos. Vettel deu um abraço caloroso em Ricciardo, mas Sebastian sabe que no momento em que a Red Bull voltar a ter um carro para brigar pela vitória, isso poderá ser um problema, só bastando olhar para o que acontece no box da Mercedes. Porém, Sebastian Vettel teve sorte em não se envolver no forte acidente entre Massa e Pérez. Com o abandono de Lewis Hamilton e os problemas em seu carro, Nico Rosberg não tem muito do que reclamar do seu segundo lugar. Ou não? A expressão corporal de Nico no pódio indicava um sentimento de frustração e até mesmo um gesto de 'mais ou menos' ficou claro para o alemão. Metódico do jeito que é, Rosberg deve ter raciocinado que uma vitória hoje colocaria ainda mais pulgas atrás da orelha de Hamilton e o segundo lugar significou que Nico não capitalizou 100% o abandono de Hamilton, dando uma chance para o inglês. Porém, Nico Rosberg abriu uma vantagem interessante sobre Hamilton, não muito conhecido por ser um piloto cerebral nessas horas.

A parte final da corrida foi tão emocionante, que ninguém viu o que fez Jenson Button partir de uma corrida apagada rumo a um quarto lugar, ultrapassando Nico Hulkenberg e Fernando Alonso nas voltas finais, garantindo um raro bom resultado para a McLaren, que pontuou novamente com os dois carros, mas se Vettel também tivesse se envolvido no incidente da última volta, Button, que chegou a andar fora da zona de pontuação após a primeira rodada de paradas, estaria no pódio agora. Hulkenberg não foi tão eficaz quanto Pérez na administração dos pneus. Fazendo o inverso de Pérez, Hulkenberg começou com os pneus macios e tendo que ficar muito tempo na pista para usar os supermacios nas voltas finais, perdeu tempo e retornou à pista no tráfego, não podendo utilizar o melhor momento de sua borracha, terminando em sexto. Mesmo acabando a prova no muro, Pérez voltou a fazer uma corrida como nos bons tempos da Sauber e merece parabéns pela bela corrida. Até a volta 69. Alonso chegou a ficar no mesmo take de câmera dos líderes, mas a Ferrari definitivamente não construiu um carro bom e o sexto lugar foi tudo que o espanhol poderia fazer, enquanto Kimi Raikkonen fez uma corrida medonha, incluindo um erro crasso para um campeão como ele no hairpin. A Williams vinha com ritmo para até mesmo beliscar um pódio, mas como vem ocorrendo nesse ano, a equipe de Frank vem vacilando e perdendo boas oportunidades de pontuar bem. Porém, se há algo de positivo hoje, foi a ótima corrida de Massa, onde o brasileiro brigou, ultrapassou e foi rápido quando era necessário. Da mesma forma como fazia até 2008, quando não tinha o mesmo brilho de Hamilton e Alonso, mas compensava com uma garra contagiante. O acidente assustador na última volta não diminui em nada a boa corrida do brasileiro. Mesmo menos brilhante do que seu companheiro de equipe, Bottas novamente abriu vantagem sobre Massa no campeonato, indicando que a sorte é uma virtude do finlandês. Vergne marcou bons pontos com uma corrida correta, enquanto a Sauber fez outra corrida ruim, onde o time suíço parece cada vez mais próximo das nanicas do que do pelotão da frente.

Ao contrário do imaginado, a F1 entrará nesse ritmo de Copa do Mundo animada por uma corrida sensacional, com a quebra da invencibilidade da Mercedes e alguns pilotos voltando a mostrar serviço. Olhando unicamente para o campeonato, a corrida em Montreal pode ter sido um marco para Nico Rosberg, que mesmo não capitalizando em 100% o segundo abandono de Hamilton nessa temporada, abriu bons pontos para o companheiro de equipe. Enquanto tinham carros com todo potencial, Rosberg e Hamilton brigaram de forma próxima e a cara de Toto Wolff demonstrava a apreensão que essa briga poderá se tornar daqui para frente. Porém, nesse momento, Daniel Ricciardo só tem o que comemorar com sua primeira vitória na F1 e para nós, torcedores e fãs da F1, também comemorar que Montreal ficará pelo menos mais dez anos na F1!

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