Mostrando o quanto os pilotos do passado eram mais acessíveis, a Quatro Rodas publicava uma coluna mensal de Jackie Stewart, então o melhor piloto do mundo. O escocês dava suas impressões sobre as corridas do mês anterior ou até mesmo de problemas de bastidores. Na edição de Janeiro de 1971, o então Campeão Mundial nos explica toda a confusão que foi o Grande Prêmio do México de 1970, realizado 40 anos atrás. Vamos aos melhores momentos.
Um público de 150.000 pessoas aglomerou-se junto às barreiras e sentou-se na grama à margem da pista. Os organizadores foram aos boxes avisar às equipes sobre esse problema. Saímos para dar uma olhada ao longo da reta. Era fantástico! Havia gente e até mesmo cachorros andando pela pista, enquanto um número incrivelmente grande de torcedores estavam sentados no chão, de pernas cruzadas e com sombreros caídos sobre os olhos. E isso a meio metro da pista.
Os organizadores tantaram fazê-los recuar, mas nada conseguiram. Era evidente que a prova não podia ser iniciada naquelas condições. Comunicamos isso aos organizadores e eles apenas se mostraram surpreendidos. O problema teria que ser resolvido rapidamente, pois a multidão estava se tornando irrequieta, assobiando e vaiando o atraso. Um dos organizadores disse aos pilotos: Não se preocupem com o risco de atropelar alguém, nós estamos segurados e vocês também.
Os organizadores - desesperados para encontrar uma solução - sugeriam que eu e Pedro Rodríguez andássemos pela pista, pedindo ao público que se afastasse. Com o castelhano de Rodríguez, meu inglês e um intérprete, suplicamos aos expectadores que recuassem alguns metros. Eles foram bastante compreensíveis e de fato recuaram. Por quanto tempo, isso era outro problema.
Infelizmente, ao recuar, os espectadores que haviam ultrapassado a cerca impediram a visão dos que mantiveram-se atrás dela. Estes então começaram a protestar, gritando e atirando latas e garrafas sobre a pista. Em poucos minutos, ela estava recoberta de cacos de vidro. Pedimos aos borracheiros (???) da Dunlop, Firestone e Goodyear que examinassem a situação: haviam cacos do tamanho de um punho e bastaria um fragmento do tamanho de uma unha para furar um pneu.
Os varredores começaram a trabalhar, mas outras garrafas continuavam a se despedaçar na pista. O problema só foi resolvido quando terminou o estoque de garrafas vaziam em poder da multidão enraivecida. Então fizemos três voltas de reconhecimento e voltamos aos boxes, onde verificamos que meu carro sofrera um furo e o de Ickx tinha um dos pneus cheios de cacos de vidro. Decidimos que não haveria corrida. Mas os organizadores suplicaram para reconsiderarmos a decisão e os policiais nos disseram que, se a prova fosse cancelada, haveria uma pancadaria da qual sairiam feridas e mortas tantas pessoas quantas vitimadas no caso de um carro atropelas a multidão. Diante disso, resolvemos arriscar.
Para mim, a corrida terminou ainda no começo, quando meu carro atropelou um cão (eu estava a uns 225 km/h) e se descontrolou, por pouco não investindo sobre a massa de espectadores.
E pensar que a F1 atual quase não corria na Coreia...
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