quarta-feira, 20 de outubro de 2010

História: 20 anos do Grande Prêmio do Japão de 1990




Havia um cheiro de vingança no ar. Ayrton Senna nunca havia se conformado com a perda do título de 1989, quando foi jogado para fora por Prost nas últimas voltas do mesmo Grande Prêmio do Japão, em Suzuka. Para quem tem discernimento, sabe que a desclassificação de Senna em Suzuka/1989 foi justa, mas para o brasileiro e seus torcedores, ele havia sido roubado descaradamente pela dupla francesa Prost-Balestre. Senna era o principal favorito a conquistar o campeonato de 1990, mesmo com a Ferrari vindo numa ótima fase ao vencer as duas últimas corridas, mas Prost sabia que seria difícil para tirar o título do arqui-rival, pois estava praticamente na situação contrária do ano anterior, quando o francês tinha uma enorme vantagem sobre Senna quando chegou à Suzuka.

A perspectiva de uma nova disputa tensa entre Senna e Prost em Suzuka diminuiu um pouco o impacto sofrido pela F1 com o terrível acidente sofrido por Alessandro Nannini dias antes da corrida japonesa. O piloto da Benetton voltava para sua casa de helicóptero quando o aparelho caiu e o italiano teve seu braço direito decepado na altura do cotovelo. Nannini foi levado imediatamente para um hospital em Roma e seu braço foi recuperado, mas o promissor italiano, que havia recusado uma proposta da Ferrari por acreditar no projeto de Flavio Briatore na Benetton, nunca mais corresse profissionalmente de F1, apesar de que Nannini se tornasse um ótimo piloto de DTM, pela Mercedes e ter feito um teste num Ferrari F1 adaptado anos depois. Piquet, que era muito amigo de Nannini, indica seu velho amigo Roberto Moreno para substituir o italiano na Benetton e mesmo com sua equipe, a fraquíssima Eurobrun, tenha colocado alguns obstáculos, Moreno finalmente teria um cockpit de F1 minimamente decente.

Todos conheciam o quanto Senna era um piloto extremamente veloz em ritmo de Classificação e por isso não foi surpresa vê-lo ficar com a pole, mas Prost, normalmente comedido aos sábados, deu muito trabalho ao brasileiro e ficou em segundo lugar, dando um tempero a mais para a corrida. Logo após os treinos, a corrida começou nos bastidores, com Senna solicitando que seu lugar como pole-position fosse mudado de lugar e largasse por fora, onde os carros passam normalmente na reta e há mais aderência. Porém, o pedido foi negado. Senna ficou furioso, dizendo que aquilo era mais uma armação psicológica de Prost. Conta a lenda que os comissários japoneses, fãs ardorosos de Senna, teriam aceito o pedido do brasileiro, mas Jean-Marie Balestre, da sala da presidência da FISA em Paris, teria ligado para o Japão impedindo que isso acontecesse. Mais tensão, impossível!

Grid:
1) Senna (McLaren) - 1:36.996
2) Prost (Ferrari) - 1:37.228
3) Mansell (Ferrari) - 1:37.719
4) Berger (McLaren) - 1:38.118
5) Boutsen (Williams) - 1:39.324
6) Piquet (Benetton) - 1:40.029
7) Patrese (Williams) - 1:40.355
8) Moreno (Benetton) - 1:40.579
9) Suzuki (Lola) - 1:40.888
10) Martini (Minardi) - 1:40.899

O dia 21 de outubro de 1990 estava quente e pela primeira vez desde que foi realizado em Suzuka, o Grande Prêmio do Japão seria realizado debaixo de muito sol. Senna estava otimista de que conquistaria seu bicampeonato. "Títulos tem sido decididos aqui e espero que esse ano aconteça o mesmo," dizia o brasileiro, dando a entender que Suzuka poderia ver outra decisão polêmica. Na verdade, o piloto da McLaren estava afunilando toda a sua frustração da perda do título de 1989 e a decisão da FISA em não mudar o lugar do pole-position para uma largada agressiva, principalmente se perdesse o primeiro lugar para Prost. Como era de se esperar, Prost larga melhor, pelo lado limpo, e tem o melhor traçado para contornar a primeira curva, Senna fica ligeiramente atrás da Ferrari, mas nitidamente por dentro. Há quem diga que Senna largou mal de propósito para se vingar. Verdade ou não, o fato foi que Senna acertou a Ferrari de Prost bem no meio e era Campeão Mundial pela segunda vez.

O mundo parecia não estar surpreso com a manobra de Senna. Ao contrário, parecia até mesmo esperar aonde e quando o brasileiro se vingaria de Prost. Se em 1989 Prost bateu em Senna no ponto mais lento do rápido circuito de Suzuka, já no final da prova, Senna não esperou mais do que algumas centenas de metros para bater na traseira de Prost a aproximadamente 200 km/h. Por sorte, ninguém se machucou. Apenas a ética esportiva. Como Prost havia mostrado no ano anterior, Senna apenas corroborava em 1990 que os fins justificam os meios. Para ser campeão, vale tudo, até mesmo colocar em risco sua própria vida e do companheiro de profissão. O pior foi não ter admitido isso. No filme oficial da temporada de 1990, Ron Dennis 'entrevistava' Senna após o título definido e o brasileiro dava a entender claramente que a culpa pelo acidente era de Prost, que não teria lhe dado espaço suficiente. Nesses casos, assumir a culpa seria muito menos feio do que fingir de que nada ocorreu. Já para Prost, reclamar era sua obrigação como profissional, mas talvez nem tanto como pessoa. Afinal, ele havia feito algo similar um ano antes...

Se em 1989 os demais 24 pilotos foram coadjuvantes a corrida japonesa inteira, agora ele foram apenas por alguns metros e havia uma prova a ser decidida. Graças ao entrevero entre os dois rivais, Berger, que havia largado muito bem, assumia a liderança, seguido por Mansell e os dois Benettons, com Piquet à frente de Moreno, que havia feito uma largada sensacional. Graças a nuvem de poeira erguida pelo incidente na primeira curva, Stefano Modena e Phillipe Alliot bateram, assim como os dois carros da Arrows. Porém, isso não seria tão significativo quanto a bizonha rodada de Berger na curva um, na abertura da segunda volta. O austríaco passou o ano reclamando da sorte, mas quando tinha uma corrida nas mãos, Berger jogou tudo fora, enquanto Senna e Prost, andando juntos, mas sem se olhar, voltavam lentamente aos boxes. Isso deixava Mansell como o favorito máximo para vencer a corrida, pois tinha o único carro restante de McLaren e Ferrari, equipes que dominaram o ano inteiro.

Nigel tinha tudo para exorcizar o azar que o havia perseguido em suas passagens por Suzuka e tinha uma vantagem confortável sobre os dois carros da Benetton quando foi aos boxes trocar seus pneus. O inglês precisava retornar rapidamente à pista, pois a maioria dos pilotos que estava atrás dele não parariam nos boxes e Mansell acelerou com tudo após um pit-stop perfeito da Ferrari. O problema foi que o 'Leão' acelerou demais e a transmissão da Ferrari quebrou ainda no pit-lane, fazendo com que Mansell socasse seu volante por tamanha burrada e abandonasse ali mesmo. Com isso, Piquet assumiu a liderança da corrida. Sem vencer uma prova desde o tricampeonato em 1987, muitos diziam que Piquet ainda estava na F1 apenas por dinheiro, mas o veterano campeão mostrava sua velha classe ao liderar sem sobressaltos a corrida em Suzuka e fazer as pazes com a vitória. Ao seu lado, duas surpresas. Alguns dias antes, Roberto Moreno tinha apenas esperança de classificar seu fraco Eurobrun para o grid em Suzuka, mas quis o destino que o brasiliense conseguisse um ótimo cockpit e combinado com uma pilotagem sólida e sem erros, conquistasse seu primeiro e único pódio na carreira. As cenas após a corrida foram emocionante, com um claramente emocionado Roberto Moreno abraçando Briatore e Piquet como se fosse ele, Moreno, que tivesse conquistado o título naquele dia. Aquela atuação garantiu a Moreno um lugar na Benetton em 1991. Em terceiro, chegou Aguri Suzuki, utilizando seu vasto conhecimento da pista de Suzuka e uma prova segura garantindo ao japonês não apenas seu primeiro pódio, como também o primeiro trófeu a um piloto nipônico, para delírio do público local, mesmo eles preferindo o sexto colocado Satoru Nakajima. Com uma dobradinha na corrida e o título no bolso, o Brasil acordava feliz naquele domingo, mas será que valeu a pena a forma como foi?

Chegada:
1) Piquet
2) Moreno
3) Suzuki
4) Patrese
5) Boutsen
6) Nakajima

Um comentário:

Anônimo disse...

Foi a primeira dobradinha brasileira na mesma equipe e a última (no momento) na Fórmula 1.