sexta-feira, 13 de julho de 2007

Boutsen, sempre devagar e sempre

O belga Thierry Boutsen não era o tipo de piloto que fazia uma volta sensacional na Classificação do sábado ou tirasse tudo do seu carro para conseguir uma ultrapassagem. Mesmo não sendo um piloto espetacular, durante uma década Thierry Boutsen refinou a arte de levar um carro até o fim da corrida sem destruí-lo, fazendo com que os donos de equipe admirassem o belga até o final de sua carreira. Porém, Boutsen teve algumas marcas em sua carreira, como sua bela corrida em Hungaroring em 1990, quando segurou uma fila de carros da primeira à última volta com seu Williams, inclusive tendo que segurar seu amigo Ayrton Senna nos últimos giros da corrida húngara. No dia de hoje, Boutsen irá se tornar um cinqüentão e por isso vamos dar uma olhada na carreira de Thierry.

Nascido em Bruxelas no dia 13 de Julho de 1957, Thierry Marc Boutsen cresceu vendo o seu ídolo Jacky Ickx encantar a todos os seus compatriotas correndo de Ferrari e Lotus na F1. Boutsen começou sua carreira no automobilismo em 1975 como estudante da Pilette Racing School localizado no circuito de Zolder, de propiedade do antigo piloto de F1 Andre Pilette. Na mesma época Boutsen tinha ingressado na faculdade para estudar engenharia, mas não tardou para Thierry deixar a engenharia de lado para se dedicar ao automobilismo. Em 1977 ele comprou um chassi Hawke para correr no campeonato belga de F-Ford 1600 e no ano seguinte ele trocou de Hawke para o chassi Crossle e venceu o campeonato Benelux de F-Ford 1600 com 15 vitórias em 18 corridas. Este foi o impulso que Boutsen precisava!

Em 1979 ele sobe de categoria e parte para a F3 européia e alemã e em 1980 Boutsen é contratado para ser o piloto principal da equipe de fábrica da Martini de F3, mesma equipe que tinha dado o título europeu para Alain Prost no ano anterior. Boutsen vence três etapas do campeonato em Nürburgring, Zolder e Magny-Cours e se torna vice-campeão no final do ano, perdendo o campeonato para Michele Alboreto. A equipe oficial da March fica interessada em Boutsen e o contrata para disputar o campeonato europeu de F2 em 1981. Boutsen só foi marcar pontos na sua quarta corrida, mas o fez conseguindo sua primeira vitória na F2 no circuito italiano de Enna-Pergusa. Boutsen ainda venceria a tradicional corrida em Pau, na França, e terminaria o campeonato mais uma vez com um vice-campeonato, perdendo o campeonato para Geoff Lees. Era o segundo vice seguido.

Nessa época Boutsen estava louco para subir para a F1, mas como não conseguiu lugar na categoria, resolveu ficar mais um ano na F2 em 1982. Com o forte patrocínio da Marlboro e ao lado de Stefan Johansson, Boutsen competiu pela equipe Spirit-Honda. Ele venceu três corridas em Nürburgring, na frente dos seus torcedores em Spa e repetiu a vitória no ano anterior em Enna-Pergusa. Mesmo com mais vitória do que no ano anterior, Boutsen ficou em terceiro no campeonato e o que foi mais dolorido foi ver que Corrado Fabi, seu antigo companheiro de equipe na March, levar seu March-BMW ao título. A Spirit estava com um projeto para iniciar uma equipe na F1 ao lado da Honda e em 1982 Boutsen e Johansson foram chamados para testar o novíssimo F1. Foi então que Boutsen teve a segunda decepção. Mesmo superando Johansson durante todo o ano na F2, o sueco foi o escolhido para ser o piloto da equipe na F1 em 1983. Para não dizer que 1982 foi perdido, Boutsen correu no Campeonato Europeu de Turismo e nos Sport-Protótipos, ganhando os 1000 km de Monza com o francês Bob Wollek.

Tentando desesperadamente correr de F1 em 1983, Boutsen consegue 500.000 dólares em patrocínio do Diners Club e compra seu lugar na Arrows, substituindo o brasileiro Chico Serra. E não poderia ser em um lugar melhor. Desde a saída de Ickx da F1 em 1979, os belgas procuravam um piloto para torcer e com os resultados de Boutsen na F2 e F3, ele parecia ser a maior esperança belga de repetir o sucesso de Ickx e para completar a alegria dos belgas, o velho circuito de Spa-Francorchamps estava de volta à F1 depois de treze anos de ausência. É nesse clima que Boutsen faz sua estréia na F1. Boutsen mostra velocidade logo de cara ao ficar em décimo oitavo, mas abandona apenas em sua quarta volta, com sua suspensão quebrada. No resto da temporada, o melhor que Boutsen conseguiu foram dois sétimos lugares e assim não pontuou na sua primeira temporada.

Em 1984 Boutsen acerta com a Arrows e fica mais um ano na pequena equipe, sendo que desta vez ele tem que esperar várias corridas pelo potente motor turbo BMW para poder andar mais à frente e no final do ano ele acabou ficando na 15ª posição do campeonato com cinco pontos. Em 1985 Boutsen finalmente consegue um resultado de destaque, mas com muita sorte. O Grande Prêmio de San Marino era conhecido por sua chegadas com vários carros ficando sem gasolina e em 1985 não foi diferente. Senna liderou a corrida inteira e ficou sem gasolina na penúltima volta. O antigo companheiro de equipe de Boutsen, Johansson assumiu a primeira posição, mas encostou sua Ferrari poucas curvas antes do final. Com isso Prost venceu a corrida. Ou pensou que venceu. Após a corrida, a McLaren estava 2 kg abaixo do peso e Prost foi desclassificado. Assim Boutsen (que cruzou a linha de chegada empurrando o carro sem combustível...) chegou em segundo lugar e visitou o pódio da F1 pela primeira vez. Mostrando que se dá muito bem em Nürburgring, Boutsen conseguiu um ótimo quarto lugar ainda em 1985 e finaliza o campeonato com 11 pontos e o 11º lugar.

Já nessa época Boutsen já era notado pelas equipes grandes, mas uma transferência não foi possível e o belga ficou mais um ano na Arrows em 1986. Ao contrário das suas expectativas, a Arrows não teve um bom carro e Boutsen não pontuou. Por sinal, ele conseguiu quatro sétimos lugares... Cansado do lenga-lenga da Arrows, Boutsen se transfere para a Benetton no lugar de Gerhard Beger, que tinha ido para a Ferrari. A Benetton não era um equipe grande, mas poderia lhe propiciar uma maior regularidade nos pontos. Contudo, o motor Ford se mostra frágil e Boutsen anda bem algumas corridas, mas dicilmente chegava ao final da corrida. Porém, quando via a bandeira quadriculada Boutsen marcava pontos e na última corrida do ano, na Austrália, o belga foi mais uma vez ao pódio. Só que nos livros de história. Na verdade, Senna foi o segundo colocado na corrida e subiu ao pódio, mas como seus freios estavam ilegais, ele foi desclassificado e o quarto colocado Boutsen subiu ao "pódio".

Já mais acostumado a Benetton e tendo um novo companheiro de equipe, Alessandro Nannini, a perspectiva de Boutsen era das melhores para 1988, mas a McLaren fez um carro espetacular e normalmente Senna a Prost fazia dobradinha. Com isso, as equipes brigavam pelo lugar mais baixo do pódio e Boutsen conseguiu esse feito em cinco oportunidades! Foi nessa temporada que o estilo de Thierry Boutsen ficou mais em evidência. Superado várias vezes por Nannini nas Classificações, Boutsen sempre chegava ao final das corridas de forma conservadora, marcava pontos constantemente para Benetton, dando o terceiro lugar no Mundial de Construtores para a equipe. O belga conseguia sua melhor posição no campeonato de pilotos (quarto) e o maior número de pontos (27). Boutsen já queria alçar vôos maiores e em 1989 é contratado pela Williams para substituir Nigel Mansell, que iria para a Ferrari. Esse foi um marco para a Williams, pois em 1989 foi o início do casamento entre a equipe de Frank Williams e a Renault.

A Williams ainda não tinha carro para superar McLaren e Ferrari, mas em Montreal Boutsen se aproveita da chuva, das quebras de Prost e Senna e finalmente consegue sua primeira vitória na F1! Era também a primeira vitória da Renault em sua volta à F1 e logo com dobradinha, pois Patrese alcançou a segunda posição. Mais significante para a Bélgica, essa vitória no Canadá era a primeira de um piloto belga desde 1972 com Ickx. Boutsen volta ao seu estilo discreto e consegue mais três pódios durante a temporada até conseguir sua segunda vitória, em Adelaide, também debaixo de muita chuva. Em seu primeiro campeonato numa equipe grande, Boutsen termina o campeonato em quinto, apesar das duas vitórias. A Williams crescia a olhos vistos e já estava consolidada como a terceira equipe do campeonato. Boutsen e Patrese melhorava a Williams-Renault e a chegada de Adryan Newey foi um upgrade necessário para a equipe.

Boutsen vinha fazendo um campeonato bastante regular, com dois pódios e muitos pontos marcados, enquanto Patrese arriscava e já tinha uma vitória em Ímola, mas poucos pontos. Em Hungaroring, uma pista muito travada, a Williams tira a diferença para McLaren e Ferrari e coloca seus dois pilotos na primeira fila, com Boutsen marcando sua primeira e única pole na F1. Se na Classificação a Williams tinha um bom ritmo, o ritmo de corrida era bem diferente. Muito diferente mesmo. Enquanto Boutsen se matinha em primeiro num ritmo bom, mas sem ser espetacular, o segundo colocado Patrese era atacado por McLarens, Benettons, Ferraris e a Tyrrell de Alesi. Quando Patrese tem que fazer uma parada e perde posições, Boutsen tem que se virar para segurar carros muito mais rápido que sua Williams. No final, Senna estava colado em Boutsen, mas o belga se segura e consegue sua terceira vitória na F1. Foi sua melhor corrida na carreira!

Por ironia do destino, essa vitória na Hungria foi o início do sue declínio. A Williams havia trazido Nigel Mansell de volta à equipe e precisava escolher qual dos seus dois pilotos iriam ter que ceder o seu lugar para Mansell. Boutsen foi o escolhido. Sem ter nenhuma equipe grande para ir, Boutsen vai para a decadente equipe Ligier. Mesmo com os potentes motores Renault, a Ligier estava longe dos seus melhores dias e Boutsen voltou aos dias em que lutava para marcar pontos. Mas na verdade é que em 1991, Boutsen não conseguiu colocar o carro azul nos pontos. Em 1992 a Ligier se uniu a Lamborghini e como era esperado o ano foi muito difícil, mas ao menos Boutsen saiu do zero e chegou em quinto lugar na Austrália. Já muito desmotivado, Boutsen saí da Ligier e graças aos seus patrocinadores consegue um lugar como segundo piloto da Jordan. Constantemente superado por Rubens Barrichello e já com 35 anos, Boutsen tem a idéia de transformar o GP da Bélgica de 1993 em um evento simbólico para o melhor piloto da nação desde Jacky Ickx. Após dez anos em atividade, a corrida em Spa seria a despedida de Boutsen da F1 na mesma pista onde estreou. Thierry, de forma atípica, abandonou na primeira volta com um câmbio quebrado.

Após sair da F1 Boutsen se torna um piloto costumaz das corrida de endurance, como as 24 Horas de Le Mans, inicialmente como piloto da Porsche. Em 1998 Boutsen se transfere para a Toyota, que inicivava um projeto de vencer as 24 Horas de Le Mans. Em 1999 ele guiava um carro da equipe japonesa quando sofreu um gravíssimo acidente em Le Mans, fraturando uma vértebra. Após esse susto, Boutsen resolve abandonar as pistas e se dedica a uma nova paixão: a aviação. Neste momento, Thierry Boutsen é fundador e presidente da Boutsen Aviation, uma firma que aluga jatos para executivos na Europa e nos Estados Unidos, e hoje Boutsen mora em Mônaco. Porém, quando o belga despacha seu seviços para pessoas abonadas que precisam ganhar tempo (contanto que não seja no Brasil...) e chegar aos seus detinos, Boutsen deve se lembrar de suas vitórias no molhado ao volante do seu Williams-Renault, ou ainda recordar com muita saudade da sua batalha no final do Grande Prêmio da Hungria com seu amigo Ayrton Senna.

Parabéns Thierry Boutsen!

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