quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

O cowboy da F1

Pouquíssimos americanos tentaram a sorte na F1 nos últimos trinta anos e os motivos variam na medida em que a Fórmula 1 não se populariza nos Estados Unidos, mesmo com todos os esforços. Mesmo assim, de tempos, em tempos, uma ave rara pousa na Europa vindo do outro lado do Atlântico na tentativa de se sobressair entre os maiores pilotos de mundo. Eddie Cheever foi uma dessas aves raras. Se bem que o americano cresceu na Europa e dá para se dizer que Cheever é um ianque bem "europeu". Piloto regular durante os anos 80, Cheever foi bastante precoce em seu início de carreira, mas o tempo passava e o americano não explodia e assim ele viu sua carreira na Europa se diluindo. Na tentativa de se tornar mais "americano", Cheever volta à sua terra natal, ficando raízes e conquistando seu maior triunfo na vida. Prestes a se torna um cinqüentão, vamos olhar um pouco a carreira desse Cowboy diretamente do Arizona.

Edwards McCay Cheever Júnior nasceu no dia 10 de janeiro de 1958 em Phoenix, no meio do deserto do Arizona, nos Estados Unidos. O pequeno Eddie não ficou muito tempo na América e com apenas cinco anos de idade se mudou para a Itália junto com a família, pois o pai decide montar uma academia de ginástica, algo não muito comum entre os italianos. O clima italiano era bem propício a velocidade e o papai Cheever levou os filhos Eddie e Ross para ver uma corrida de Esporte-Protótipos em Monza, no ano de 1966. Eddie, então com oito anos, fica deslumbrado com o que vê e pede ao pai para começar a correr e logo Eddie se tornou um dos melhores pilotos de kart da Itália. Ross, mais novo que Eddie, também começou uma carreira no automobilismo, chegando a correr na CART e na F-Nippon, mas sem muito sucesso.

Eddie se torna Vice-campeão Mundial de kart em 1973 e ainda fatura os campeonatos italiano e europeu no mesmo ano. Cheever tinha como companheiro de equipe Riccardo Patrese. Eles ainda se encontrariam em muitas oportunidades ao longo dos anos. O kart italiano sempre foi muito forte e não era diferente nessa época, com Cheever disputando corridas roda a roda com o próprio Patrese, Elio de Angelis e Bruno Giacomelli. Após um ano tão bom, Cheever passa para os monopostos com apenas 16 anos de idade, fazendo algumas corridas de F-Ford em 1974 e no ano seguinte dá o grande passo para a F3 Inglesa. Por coincidência, Cheever tem como companheiro de equipe no Team Modus outro americano, Danny Sullivan. Eddie mostra serviço logo de cara e consegue quatro vitórias em onze corridas, chamando atenção de um jovem chefe de equipe. Ron Dennis já começava a trilhar seu caminho rumo à F1 e sua equipe, a Project 4, era um das melhores tanto na F3 Inglesa, como na F2 Européia.

Cheever é contratado para ser piloto de Dennis na F2 Européia e bem no início da temporada, o americano consegue um ótimo quarto lugar em Thruxton, segunda etapa do campeonato, mas o carro tem alguns problemas e dificilmente chegava ao fim das corridas. Eddie ainda conquistaria um terceiro lugar em Nürburgring e fecharia o campeonato em nono lugar. Com mais experiência, Cheever se torna um piloto de ponta em seu segundo ano na forte categoria, conseguindo sua primeira vitória em Rouen, logo à frente do seu antigo companheiro de equipe no kart, Riccardo Patrese. Com mais alguns pódios, Cheever briga ponto a ponto com os dois pilotos da equipe oficial Martini Elf, René Arnoux e Didier Pironi, pelo campeonato, porém o título acaba ficando para Arnoux, com Eddie tendo que se contentar com o vice-campeonato.

Mesmo tendo apenas 20 anos, Cheever se sente preparado para ingressar na F1 e os seus bons resultados o levam para a equipe Theodore, mas o jovem americano não consegue se classificar para as duas primeiras corridas, realizadas na América no Sul. Depois dessas decepções, Cheever troca a Theodore pela Hesketh e em Kyalami finalmente consegue classificação para o grid de largada, se tornando um dos pilotos mais jovens a alinhar para um Grande Prêmio. Porém, houve algumas coisas que depuseram contra Cheever, como o fato de que Keke Rosberg, também um quase estreante, conseguiu classificar o seu antigo carro Theodore para o grid. E na frente do americano! Cheever abandona com apenas oito voltas após ter o motor quebrado. E abandona também, ao menos por enquanto, a sua entrada na F1.

Então Cheever volta para a equipe Project 4, numa terceira temporada na F2 Européia. A equipe de Ron Dennis seria uma espécie de equipe-satélite do time oficial da March e Cheever teria a disposição praticamente o mesmo March-BMW da equipe oficial, mas isso não foi uma garantia de título e Eddie ficou num distante quarto lugar, bem atrás do campeão Bruno Giacomelli e do vice Marc Surer, que dominaram a temporada na equipe oficial da March. O italiano Enzo Osella tinha uma boa reputação construindo Sport-cars na Itália, mas o mesmo não ocorria com os chassis de F2 e F3. Então Osella contratou Cheever para o Europeu de F2 e trouxe também o motor BMW. Foi uma ótima combinação. Cheever vence logo de cara a primeira etapa em Silverstone, superando Derek Daly, seu substituto na Project 4, na linha de chegada. O americano venceria ainda em Pau e Zandvoort, chegando à última etapa do campeonato, em Donington Park, na vice-liderança do campeonato, empatado com Marc Surer e a um ponto do líder Brian Henton. Porém, Cheever faz uma corrida apagada e chega apenas em sétimo, a uma volta do vencedor Derek Daly, acabando o campeonato numa decepcionante quarta posição, enquanto Surer comemorava o título com um segundo lugar.

Muito satisfeito com a façanha de Cheever na F2, Enzo Osella resolve subir para a F1 levando a tiracolo o americano em 1980. Como todo carro novo, Cheever tem que se bater com vários problemas de confiabilidade e dificilmente conseguia terminar uma corrida com o carro, que além de tudo, era lento. Em Ímola, circuito que conhecia, Cheever consegue uma boa décima sétima posição no grid e completa sua primeira corrida na F1. No Canadá, o americano consegue largar entre os quinze primeiros, chamando a atenção dos chefes de equipe da F1. Ken Tyrrell, sempre de olho em jovens talentos, contrata Eddie para correr em sua equipe em 1981. E Cheever não decepciona. Logo na primeira etapa de 1981, em Long Beach, Cheever faz uma ótima corrida em casa e termina na quinta posição, marcando seus primeiros pontos na F1. Mesmo com a Tyrrell já enfrentando crônicos problemas financeiros, Cheever faz uma boa temporada, marcando pontos de forma até regular e tem como melhor resultado um quarto lugar em Silverstone. Com uma atuação tão forte, não foi surpresa ver as grandes equipes de olho em Cheever e em 1982, o americano se transferiu para a equipe Ligier.

O time francês tinha brigado pelo título nas duas últimas temporadas com Jacques Laffite, mas um carro novo que demorou a estrear e um motor Matra já sentindo as marcas do tempo, não permitiram que a Ligier repetisse os resultados dos anos anteriores. Cheever superou algumas vezes seu experiente companheiro de equipe, Laffite, e conquistou seu primeiro pódio no trágico Grande Prêmio da Bélgica, mas o americano não ficou com o troféu, pois só "subiu" para a terceira posição com a desclassificação da McLaren de Niki Lauda. Nas corridas que fez em casa, Cheever mostrou serviço e conquistou mais dois pódios em Detroit e Las Vegas, ficando em12º lugar na classificação de pilotos.

Então Cheever teve sua grande chance na F1. Ele assinou com a equipe Renault para 1983 e teria como companheiro de equipe o francês Alain Prost. A Renault vinha batendo na trave há alguns anos e na época tinha o maior orçamento da F1. Já estava na hora da equipe francesa ser campeã! Como primeiro piloto não-francês na história da equipe, Cheever seria claramente segundo piloto de Prost na briga do gaulês pelo campeonato. Fora que Prost era claramente mais rápido que o americano, como demonstrado no Grande Prêmio da França, quando a Renault dominou a primeira fila com Prost colocando 2.5s de diferença em cima de Cheever. Mesmo com essa desvantagem, Eddie conseguiu algumas boas corridas, como no Canadá, quando terminou em segundo lugar. Mesmo com quatro pódios, ter terminado o campeonato em sétimo lugar e ter sido um ótimo segundo piloto, antes mesmo do final da temporada, Cheever já sabia que não teria seu contrato renovado.

Em 1984 a Alfa Romeo teria uma nova administração, agora nas mãos de Paolo Pavanello, um novo patrocinador, a Benetton, e uma nova dupla de pilotos. Ainda com um bom nome dentro do mercado da F1, Cheever foi chamado para a equipe italiana e reeditou a dupla que fez sucesso no kart dez anos antes, com Patrese. Porém, o que parecia promissor se transformou em pesadelo. O começo até que foi bom, com Cheever completando a sua primeira corrida no Brasil em quarto lugar, tendo que enfrentar um problema bem incomum durante a corrida. Num golpe de azar, a viseira do capacete de Cheever voou e o americano teve que ir aos boxes trocar de capacete e ainda teve que economizar no final da prova para não ficar sem combustível. Porém, o Alfa V8 mostrou além de apetite, uma inconfiabilidade de dar medo. Cheever abandonou em14 ocasiões com problemas relacionados ao motor durante o ano. Durante um período de um mês e meio Cheever e o companheiro de equipe Patrese quebraram 22 motores. E dez dessas quebras foram durante um período de seis dias! Mesmo com esse cartel Cheever permaneceu na equipe em 1985, mas os problemas continuaram e o americano passou outro ano em branco, com o carro raramente terminando uma corrida. O tempo de Cheever já tinha passado na F1.

Depois de duas temporadas horríveis, de repente Cheever se achou sem equipe em 1986 e decidiu correr no Mundial de Esporte-Protótipo. Contratado pela equipe TWR Jaguar, Cheever venceu os 1000 km de Silverstone e foi segundo em Norisring. Durante o Grande Prêmio do Canadá de F1 Patrick Tambay quebrou o dedão durante o warm-up e a equipe Lola ficou sem piloto para o Grande Prêmio dos Estados Unidos, em Detroit. A equipe primeiramente tentou trazer Michael Andretti, mas a transação acabou não dando certo e Cheever foi trazido para fazer essa corrida. E não se arrependeu! Superando com folga seu então companheiro de equipe Alan Jones, Cheever colocou seu nome novamente no mercado de pilotos. Cheever também faria uma corrida na CART em Miami, pela equipe Arciero, mas o americano acabou escolhendo voltar à F1 para 1987.

Ao lado de Derek Warwick, outro piloto com muito talento, mas que não soube utilizá-lo, Cheever faria uma reestréia na F1 com a equipe Arrows. O carro da pequena equipe era projetado pelo jovem desenhista Ross Brawn e não era de todo mal, com Cheever voltando a marcar pontos depois de quatro anos com um quarto lugar na Bélgica, porém seu melhor momento seria no ano seguinte. Vinte e dois anos depois de assistir sua primeira corrida de automóvel em Monza e se apaixonado pelo esporte, Eddie conseguia um pódio no Grande Prêmio da Itália logo atrás das Ferraris. Mesmo tendo apenas 31 anos, Cheever já tinha muito cabelo branco e sentia que estava na hora de abandonar esse circo que pouco tinha lhe dado em troca. Porém, Cheever ainda daria uma nova surpresa. Após vários anos ocorrendo em Detroit, o Grande Prêmio dos Estados Unidos de 1989 seria realizado em Phoenix, cidade natal de Cheever. Correndo com uma garra que não tinha mostrado até então, Eddie faz uma corrida excepcional e consegue seu último pódio na F1, em terceiro lugar, ao lado de dois ex-companheiros de equipe: Prost e Patrese. No final do ano, Eddie Cheever sairia da F1 com um cartel de 132 Grandes Prêmios, nove pódios e 70 pontos.

Sempre correndo longe de casa, Eddie Cheever resolve voltar para os Estados Unidos e se volta com total dedicação para a CART, sendo contratado pelo ex-piloto Chip Ganassi. À bordo de um Penske de segunda mão, Cheever consegue um bom sétimo lugar em sua estréia, em Long Beach, mas o melhor ainda estava por vir. Em sua estréia nas 500 Milhas de Indianápolis, Eddie consegue um bom décimo quarto no grid e uma ainda melhor oitava posição na corrida. Cheever consegue dois terceiros lugares em Detroit e Toronto, conquistando o valorizado prêmio de Novato do Ano de 1990. Logo Eddie Cheever se torna um dos pilotos de ponta da CART, mas não consegue nenhuma vitória e termina em nono lugar na Classificação em 1990, 91 e 92. Em 1992 ele consegue sua melhor posição nas 500 Milhas de Indianápolis até então com um quarto lugar. A CART era uma categoria tão forte como a F1 e não era incomum Eddie reencontrar antigos companheiros de pista nos Estados Unidos. Porém, a carreira de Cheever começou a entrar em declínio e quando ele saiu da Chip-Ganassi em 1993, ele ficou sem equipe nas duas temporadas seguintes até se juntar à equipe Foyt em 1994. A equipe do consagrado A.J. Foyt não era nem sombra das conquistas do dono e Cheever teve que se acostumar a andar no meio do pelotão, mas ele teve uma chance de ouro em 1995, quando ficou sem combustível na última volta da corrida em Nazareth quando liderava...

Quando houve a cisão entra CART e IRL em 1996, Cheever tomou a iniciativa de se unir à liga rival e voltar às 500 Milhas de Indianápolis. E também ao pelotão dianteiro. Em 1997, Eddie decide formar sua própria equipe e consegue sua primeira vitória na IRL em Orlando, no Walt Disney Speedway, depois de ficar sem subir ao topo do pódio por... 18 anos! Como esperado, Cheever voltou a ser protagonista de uma categoria, que mesmo não tendo os melhores pilotos da época, tinha o trunfo de correr em Indianápolis. E Eddie aproveitou bem a chance que teve e conquistou o melhor resultado de sua vida ao vencer as 500 Milhas de 1998! Sempre com a Team Cheever, Eddie venceu mais três corridas (Orlando, Pikes Peak e Kansas) nas três temporadas seguintes, conquistando um ótimo terceiro lugar no campeonato do ano 2000.

Cada vez mais preocupado com sua equipe, Cheever resolveu abandonar sua carreira de piloto em 2002, mas como a velocidade sempre esteve no sangue deste piloto do Arizona, ele disputou as 24 Horas de Daytona de 2006 e voltou a um monoposto com a mal-fadada GP Masters. Isso animou Cheever a fazer uma "festa" de despedida, participando das 500 Milhas de Indianápolis de 2006 e mais algumas corridas durante o ano pela IRL. Sua equipe, que chegou a ter apoio da Red Bull por um tempo, estava muito enfraquecida e Cheever só andou nas últimas posições. Durante a corrida em Watkins Glen em 2006, Eddie, como retardatário, tirou da corrida o líder Marco Andretti e no final da prova teve que sair correndo de metade do clã Andretti! Hoje em dia Cheever participa do Campeonato Americano de Gran-Am como piloto e chefe de equipe e ajuda seu sobrinho, Richard Antinucci, a subir na carreira de piloto. Mesmo sem ter conquistado grandes resultados na F1, Cheever mostrou que o potencial mostrado na F2 estava intacto na vitória das 5oo Milhas de Indianápolis.

Parabéns!
Eddie Cheever

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