As corridas de automóvel são imprevísiveis. O clichê é antigo, mas é verdadeiro. Lewis Hamilton tinha a faca e o queijo na mão para sair de Xangai com o título no bolso, mas numa justiça divina, foi afoito aonde não poderia ter sido e colocou seu título em risco, vendo o ressurgimento de Fernando Alonso e a perigosa aproximação de Kimi Raikkonen. Após o surgimento do vídeo no Grande Prêmio do Japão onde Hamilton fazia constantes brake-tests em cima do segundo colocado Mark Webber, provocando um acidente entre o australiano e Sebastian Vettel, todo mundo no paddock do superlativo autódromo de Xangai esperava a punição do piloto da McLaren, mas eis que nada acontece e o cheiro de impunidade ficou no ar, mas como dizem que aqui mesmo que se paga o que faz, Hamilton acabou "punido" por si próprio e perdeu os dez pontos conquistados semana passada na base da malandragem.
O tufão que devastou Taiwan nesse final de semana não atingiu Xangai a tempo de afetar mais decisivamente a corrida e a chuva que caiu não foi a tempestade esperada. Com todos os pilotos largando com pneus intermediários (inclusive a Ferrari!), Hamilton disparou à frente das Ferraris. Alonso chegou a fazer uma arrojada ultrapassagem em cima de Massa, mas o brasileiro descontrou poucas curvas depois. A corrida à parte entre os quatro primeiros colocados foi sendo dominada por Lewis, enquanto mais atrás o pau comia solto, com várias ultrapassagens na pista ainda úmida e tornando a corrida bem divertida. Como era esperado, Hamilton foi o primeiro a parar nos boxes e já nesse momento a pergunta era se já estava na hora de colocar pneus slicks. Nenhum dos quatro primeiros tentaram dar o pulo do gato.
Quando Felipe Massa saiu da pista (cena não captada pela TV), o brasileiro foi o primeiro a fazer a troca bem na hora em que uma garoa fina caiu no autódromo. Hamilton, Raikkonen e Alonso esperaram mais um pouco para calçar os slicks e isso foi decisivo para a corrida. Com os pneus acabados, Hamilton foi perdendo rendimento até ser ultrapassado por Raikkonen e quando Alonso se preparava para repetir a manobra, Hamilton foi para os boxes. A situação do pneu traseiro direito era tão delicada que parte da construção do pneu já estava à mostra. Assim, Hamilton não precisava entrar nos boxes tão rápido e sair da pista de forma bizonha, acabando sua corrida na caixa de brita na entrada dos boxes. Hamilton pedia para ser empurrado. Ron Dennis, vendo tudo pela TV, pedia para os comissários empurrarem Hamilton. Os engenheiros da McLaren não acreditavam. Por mais que a FIA, supostamente, quisesse dar uma mão à Hamilton, ser empurrado pelos comissários era proteção demais e Hamilton saiu do carro e abriu de vez o campeonato.
Raikkonen fez sua parada na volta seguinte e voltou numa tranqüila liderança. Alonso se aproveitou dos primeiros momentos hesitantes de Massa quando pôs os pneus slicks e superou o brasileiro por muito pouco e os três foram assim até o fim. Numa demonstração de que tinha carro suficiente para vencer a corrida, Felipe marcou uma série de voltas mais rápidas e chegou a encostar no espanhol no final, mas não a ponto de ultrapássa-lo. Raikkonen venceu pela quinta vez no ano e se tornou o piloto a ter mais vitórias nessa temporada.
Porém, atrás da briga pelo campeonato, havia outras histórias e o principal protagonista foi mais uma vez Sebastian Vettel. O alemão da Toro Rosso conseguiu um espetacular quarto lugar e foi o melhor do resto com uma tocada firme e sem erros. O jovem de apenas 20 anos vem se firmando cada vez mais dentro da F1 e a Red Bull terá que se virar para manter Vettel nas suas fileiras nos anos seguintes, pois em breve as equipes grandes irão querer o alemãozinho. Red Bull, por sinal, foi superada pela sua cria na China, pois a Toro Rosso também colocou Vitantonio Liuzzi na sexta posição, enquanto Coulthard fez as honras da casa austríaca ao ser oitavo colocado, muito acossado pela Renault de Heikki Kovalainen no final, acabando com a incrível sucessão de pontos marcados do novato finlandês. Outro que mereceu destaque foi Jenson Button, que conquistou a melhor posição da Honda com um quinto lugar num ritmo agressivo, com muitas ultrapassagens, voltas mais rápidas e paradas nos boxes na hora certa. Em compensação, Barrichello se envolveu num incidente com Anthony Davidson ainda na primeira volta, entrou nos boxes na hora errada e foi um obscuro décimo quinto colocado. A Honda deve estar se perguntando se fez bom negócio em renovar com o brasileiro para 2008. A BMW esteve longe dos bons momentos de 2007 na China, apesar de Kubica ter liderado algumas voltas ao colocar os pneus slicks na hora certa, mas um problema mecânico frustrou os sonhos do nasal polonês. Heidfeld terminou ainda nos pontos, em sétimo, sem poder conseguir ultrapassar Liuzzi, apesar da enorme pressão do alemão no terço final da corrida. Outro destaque foi Ralf Schumacher, que foi tocado ainda na primeira curva, vinha ultrapassando quem via pela frente até tocar com Liuzzi numa tentativa otimista de ultrapassagem. Um dos primeiros a colocar os pneus slicks, Ralf rodou e abandonou, mas com certeza foi sua melhor corrida do ano. Pena que essa apresentação tenha acontecido um pouco tarde demais, pois se Ralf andasse assim antes, com certeza o demitido da Toyota seria Trulli, mais uma vez apagadíssimo em Xangai.
Com sete pontos separando os três primeiros, a corrida do Brasil deverá entrar para a história mais uma vez, definindo um campeonato que, se não foi espetacular, foi extremamente equilibrado. Desde 1986 um campeonato não é decidido entre três pilotos na última etapa e novamente esse histórico campeonato vem à tona quando há comparações entre os campeonatos do passado com o atual. Na noite de sábado em Xangai, Alonso mais uma vez desancou a McLaren e Ron Dennis e mesmo quatro pontos atrás de Hamilton, o espanhol está de mal com a equipe. As McLarens ainda são favoritas, mas o favorito da equipe Hamilton demonstrou pela primeira vez neste ano sua inexperiência, enquanto o bicampeão Alonso tem que se virar fora da pista com a equipe. Quem pode se aproveitar disso tudo é o terceiro elemento Raikkonen, que assim como Prost fez 21 anos atrás, pode se aproveitar da briga interna na equipe rival. Porém, qualquer que seja o resultado no dia 21 de outubro, esses quinze dias que restam para a etapa brasileira serão muito tensas e entrarão para a história da F1. Assim como será a corrida. Tomara que essas duas semanas passem voando!
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